sexta-feira, dezembro 14, 2007

Silêncio

Cuité, 12 de Dezembro de 2007

Oi, Marco,

Eu não sou uma namorada legal. Deu pra perceber, né? Se fosse, estaria conversando face a face com você agora, mas preferi mandar uma carta (nem email foi). Sendo que uma conversa seria muito mais difícil, mesmo você sabendo o motivo dela. Do jeito que está para escrever já está difícil o suficiente. Eu mesma nem sei o que dizer.

Realmente não sei o que dizer.

Você me deu todo carinho que uma mulher precisa, toda atenção que eu sempre quis, foi dedicado, bem-humorado, paciente. Eu não poderia reclamar de nada. Quanto a mim, em algum momento fiquei vazia. Talvez os homens consigam lidar mais com isso, mas para uma mulher, é horrível não sentir nada. Até tentei me apegar às coisas que admirava em você. Mas a verdade é que estou cansada de dizer coisas que não sinto. Só agora tomei coragem para dizer o que sinto. E tudo que sinto é culpa. Culpa por criar essa situação e colocá-lo nela.

Sinto muito.

Perdão por mentir. Mas eu também mentia pra mim mesma. Quantas vezes eu já não olhei pra você, via tudo que queria num homem, lembrava de todos aqueles relacionamentos fracassados e dizia que com você eu não iria fracassar. Eu acreditava que aquilo seria verdade. Mas é difícil dizer coisas que não se sente. Eu queria sentir. Queria amar você com todas as minhas forças.

Fui criativa com as palavras. Mas meu coração não foi criativo.

Se você for me odiar, eu vou entender. Porque já estou me odiando.

Beijos,
Amanda

quarta-feira, novembro 21, 2007

Hiperfoco

Depois de uma enxurrada de exames, não sabia se se sentia mais aliviado ou mais apreensivo.

Tirara 125 no teste de Quociente Emocional. verificou-se que tinha facilidade em perceber as emoções de outrem e solidarizar-se com o sentimento alheio, por outro lado, tinha dificuldade de expressar as suas próprias. Dificilmente conseguia dizer ou mesmo compreender o que sentia.

Marcou 140 no teste de Quociente Intelectual Clássico (o máximo da escala) e por isso fez um seguinte mais detalhado. Nesse último fez 152 com capacidade lingüística e matemática equilibradas, tinha jeito com o reconhecimento de padrões para prever o que viria, o que o aproximava de Benedito Spinoza e Platão.

Nunca estivera diante daquele tipo de profissional e sempre tivera a imagem de Freud mudo anotando num caderninho enquanto o paciente falava tudo deitado num divã. Tanto os resultados quanto o discurso daquela psicóloga eram tudo uma grande novidade. E a ela continuava a falar. E ele, profundamente angustiado, seguia escutando calado.

Ignorar seus sentimentos, não era saudável. Aceitar quem era, com todos os limites e habilidades era imprescindível para sua felicidade. Não possuía uma inteligência convencional. Deveria valorizar isso. Sua mente gosta de ser desafiada, de investigar, de desvendar, de esmiuçar...

Naquele mar de palavras, já não as ouvia, senão ondas sonoras estourando na praia dos seus ouvidos. Fitava aquela Compactor azul com 2mm de tinta gastos batendo a ponta esferográfica no meio da folha A4, presa à prancheta sem marca de fabricante visível. Cerrou os olhos. Censurou a visão e o pensamento. Via-se como uma aberração da natureza. Um ser incapaz de fazer as banalidades que qualquer idiota faria no seu cotidiano e, por isso, cria ser ainda inferior a um imbecil. Era um incompetente de marca maior.

quinta-feira, novembro 01, 2007

Bilhetes

Prefiro andar na chuva e correr no sol.
Porque preciso entrar no clima para curti-lo.

Prefiro o tato, o olfato e o paladar.
Porque a vista e a audição sempre foram limitadas e muito pouco confiáveis.

Prefiro o prazer depois do dever.
Porque, doutro modo, o prazer tende a transformar-se em culpa.

Prefiro controlar as palavras e libertar o impulso.
Porque dificilmente um impulso meu afligirá tão profundamente quem amo.

Prefiro escrever a jogar pensamentos no ar.
Para ver se impeço que as urgências administrem minhas preferências.
E, quem sabe se relendo várias vezes, eu pare de repetir os mesmos erros.

terça-feira, outubro 09, 2007

Garimpo

É manhã. Duas horas para tomar café e atualizar-se "antes" de trabalhar, porque o chefe não considera que essa tarefa seja trabalho ou aperfeiçoamento do mesmo. Aliás, na última Happy Hour, ele tinha dito que isso era somente garantia da manutenção do vínculo empregatício.

Abre o agregador de feeds: 297 itens novos: 9 posts de amigos; 93 de fóruns; 1 de flog; 18 duma revista profissional; 147 do G1; 15 das notícias do STF; 8 das do STJ; 3 quadrinhos, 2 comentários do seu blog e 1 do flog.

E começa a filtrar: 16 para o ócio laboral ou para a hora do almoço, falta 281. G1 selecionado, ativa o scrolling numa velocidade rápida o suficiente para distinguir o importante do fútil: Quem quer saber que o promotor que bateu o carro estava com uma latinha de cerveja? Fóruns, mesma técnica. Não impressiona a miríade de tópicos repetidos: iniciantes que não procuram a leitura básica dos manuais ou o Google. Em menos de 40 minutos só restam 41. Revista eletrônica, scrolling mais lento, dois artigos merecem ser lidos. STF e STJ: Pula as fofocas e os pedidos feitos, ao todo, sobram apenas 9 decisões a ler.

Email: quase 300 filtrados no anti-spam. Uma dezena de emails pessoais, sendo um de um colega do departamento. O resto fica para depois.

terça-feira, setembro 25, 2007

In Natura

O brilho dos seus olhos fazia o dia raiar. Divertia-se moldando bichos de nuvens, guardando o barulho do mar nas conchas e fazendo nascer plantas nos lugares mais inusitados. Era especialista na arte de fazer arte, de fazer rodamoinho no pé dum pé de planta, de ensinar folha a dançar no ar, de fingir ser o amigo imaginário duma criança brincando sozinha. Tinha o riso frouxo. Tudo aquilo era muito gostoso.

Certo dia, num desses inspirados, controlando-se para não rir, colocara um sonho insano no rapaz que acabara de almoçar ao pé duma árvore. Ao virar-se, percebeu que ela estava ali, vendo a cena (ou pensou que ela tinha visto). Todavia ela fora vista: sorriso doce, voz suave, caminhar leve e um cheiro, uma fragrância, que nunca tinha sentido antes. Ficou cativado.

Numa noite qualquer, seguiu-a até sua casa. Descobriu seu quarto e fez uma rosa brotar na frente da janela. Esperou amanhecer e para ver sua reação. Não poderia ter sido melhor. Danou-se. Queria ser gente. Queria ser homem e para isso fez nascer braços e pernas, cabeça e tronco, mãos e pés. Fez sangue correr pelas veias e artérias. Seu sangue fervia.

Fervia o sangue. Fervia a alma. Nunca o sol estivera tão quente naquele ano que não teve inverno. E de tanto ferver. Evaporou-se. Nenhuma criatura aprende a ser gente de uma hora para outra. Nem gente aprende! Enquanto evaporado, sentiu os primeiros ventos frios. Resistiu e tentou lutar, porém o vento era tão implacável que o fez condensar.

Já há muito não chovia tanto quanto as águas daquela noite. E ele caiu do céu feito pedra, e como pedra ficou por incontáveis dias chuvosos. Cobriu-se de líquen, vestiu-se musgo, não achava o lodo bonito, mas acabou usando um pouco. Ele choveu tudo o que pôde e quando não pôde, pintou o firmamento de cinza e assim deixou.

Numa manhã qualquer que começara como todas as anteriores, sentiu uma cutucada no dorso. Um passarinho desavisado foi limpar o bico num cantinho esquecido pela relva que o envolvera. Fez lembrar de dias passados, fazendo-o suspirar de saudade. O suspiro abriu um pouco o céu, o suficiente para que o sol lhe mandasse os cumprimentos e chamasse-o para uma visita. Ele disse que confessava-se grato pela lembrança, mas estava "bem de pedra" (daquele jeito) e "quem sabe outro dia". Coincidentemente, ou não, o passarinho bicou-lhe as costas. Seguidas vezes. Ele não sentia as patas que algum inseto ágil em fuga, só poderia ser provocação daquela ave que queria fazê-lo levantar. Levantou-se. O passarinho saudou-o. O sol secou-lhe corpo com seus raios e refletiu seu brilho no olho negro do passarinho. Lembrou-se de si novamente, entretanto não suspirou. Tomou coragem, fez surgir asas enormes e decidiu conversar com o sol.

Passou o dia voando e proseando com o sol, um dia com tantas horas que dariam um ano, percebeu que, naquele tempo todo, não tinha visto o verde. Tudo ao redor era tão seco quanto a secura que o dominara. Agradeceu o convite ao sol, deu-lhe boa tarde e mergulhou na primeira nuvem que viu. Largou as asas e caiu no mar.

Nadou por todos os mares, fez ondas de todos os tamanhos, conheceu algumas sereias... Nem os mares quentes o fez sentir como antes. Até repetiu, por vezes sem número, várias de suas especialidades, porém aquilo perdera o sabor. Não encontrou mais lugar para si.

Preferiu viver a vagar.

segunda-feira, setembro 10, 2007

Em prosa e verso

Um certo político local, sem que nunca tivesse escrito uma rima antes, sem nunca, sequer, ter criado expectativas a respeito de qualquer qualidade artística sua, publica uma obra impecável.

Tamanha desenvoltura pode ser observada também nas páginas que descrevem seu perfil: Mal assumiu o cargo, foi convidado pelo governador do estado para ser o primeiro secretário de um novo órgão que, coincidentemente, foi ele mesmo criara enquanto ainda trabalhava na assembléia legislativa.

Parafraseando Chico Science:
"Ghost writers fazem arte,
seus clientes fazem dinheiro...
...dinheiroooooooooooo...
"

terça-feira, setembro 04, 2007

Igualdade Substancial

Desde que fui praticamente obrigado a ser o que hoje sou, tenho pensado no tal "índio lá no meio do mato". Expressão viva do contrassenso do nosso ordenamento jurídico. Conquanto a Carta Magna e o Código Civil escusaram-se desta discussão, deixaram sua capacidade jurídica regulada por leis especiais de tempos remotos que, estranhamente, tratam o índio, em um momento como incapaz (persistindo uma divergência se a incapacidade seria absoluta, por prever a nulidade de atos desacompanhados de tutela; ou relativa, por exigir uma assistência e não uma representação do órgão tutelar); ou como capaz em outro instante, a depender da integração à sociedade.

Eu não tive escolha (ou garantia). Não pude dizer que queria viver como índio, ou cigano, ou quilombola. A despeito de considerar-me tão humano quanto esses e, por tanto, credor do mesmo zelo, fui invadido pela tecnologia, pela cultura universal e por um senso de ética e moral cujas origens me são estranhas. Forçado a interagir, consolei-me com a preservação de certo folclore regional, alguns hábitos e gírias locais. Sou impedido de congelar-me no tempo e no espaço. Se é dessa feita, travestido de protesto, entendam que o índio também deveria padecer esse processo por uma questão de justiça e de isonomia. Ou disfarçado de conselho, exorto que é uma punição de caráter perpétuo promover a permanência dessa vítima numa era de trevas sem os "benefícios" (e malefícios) da modernidade. Tratam-no como um bicho que pode fazer tudo irresponsavelmente, fazendo de escudo sua cultura ancestral em face de atos que qualquer um seria condenado, ainda que a defesa alegasse ser uma "tradição da família".

É, ante o exposto, perfeitamente viável, aceitável e aconselhável que o ele conheça o mundo em que vive. E que viva pelas regras do Estado como todo cidadão, porque não deixa de ser índio aquele que deixa de ser ignorante da realidade que o cerca.

segunda-feira, setembro 03, 2007

Moralidade faz bem

Já que os navegantes do Google em busca da PEC 54 sempre aportam nesses mares, façam o favor de contribuir com o abaixo assinado:






Nome: _______________________ Identidade: ______________________ Ir para o formulário
Este abaixo assinado será enviado à Câmara dos Deputados onde estão tramitando duas PECs (Proposta de Emenda Constitucional) com o objetivo de efetivar 300.000 servidores públicos que não fizeram o concurso público determinado pela constituição federal.
Você pode enviar também sua mensagem de protesto para: ouvidoria.parlamentar@camara.gov.br



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quinta-feira, agosto 30, 2007

Hipnos

Lembrou do que disse um amigo "já está na hora de olhar para frente". Lembrou e esqueceu no mesmo instante. Não iria ficar conjecturando se o que ele estava olhando era o passado ou o futuro ou o céu. Aquilo era o agora. Isso bastava.

Beijava-a como querendo engolir-lhe a alma enquanto suas mãos reconheciam o corpo dela. Enroscava-se como uma cobra que encontra no galho sua guarida. Não queria vê-la longe nunca mais. De repente, surge um brilho forte que começa a inundar o ambiente quando, finalmente, percebe que o sol atravessara a janela do quarto, dissipando sua mulher no clarão.

Até quando invadir-lhe-á o sono? Até quando sua presença (ou ausência) seria sentida?

A voz e o riso dela ecoavam por espaços vazios dentro de si, devorados pela saudade.

sexta-feira, agosto 17, 2007

Bio

Tem "um tempinho" desde que fiz meu primeiro implante: o braço esquerdo. Não o perdi por causa de aposta (antes fosse). "Fatalidade profissional" – riscos da atividade forense.

No princípio, relutante, porém, como todos, acabei sendo empurrado para a mesa de cirurgia. Trajeto que se tornou um tanto quanto corriqueiro. A título de exemplo, a mão direita foi substituída três vezes e nem lembro por quantas fui queixando-me de ajustes nos joelhos. A essencialidade dos motivos também modifica-se. Foram bastantes os fatos dos joelhos orgânicos genuflexos, que não me permitiam demorar em pé na Tribuna ou no Júri; das dores lambaris; duma gastrite incurável, etc. Existem lá alguns efeitos colaterais inusitados: vez por outra acordo com as mesmas dores terríveis nos joelhos que me acompanharam durante praticamente toda a adolescência e, na época, o médico costumava dizer que era "de crescimento", como se isso servisse de consolo a quem tinha 12 anos de idade. Ressalvadas certas idiossincrasias, o procedimento hoje é bem tranqüilo. Troquei as últimas partes por artificiais há pouco menos de 50 anos, quando já tinha a certeza de que tudo iria funcionar como se natural fosse.

Não creio que deixei de ser "eu" pelo que perdi do corpo original. Não acredito que minha alma ou meu espírito estavam vinculados àquela massa biológica. Tanto é verdade que ainda guardo, com carinho e saudade, meus cabelos de quando eram compridos junto ao anel que ela me deu, o mais significativo presente que dela recebi.

quarta-feira, agosto 01, 2007

Hi-Fi

O filme Alta Fidelidade não é espetacular, mas é gostoso de assistir. Para ele (que faz o gênero que associa uma pessoa, um evento, um momento ou praticamente tudo a uma música), um deleite. Dizem que para cada ocasião da vida existe uma do Cazuza. Falam o mesmo das do Legião. Entretanto, naquele exato instante não tinha uma que lhe servisse. Talvez uma frase ou outra tão fora de contexto que nem daria para cantarolar um verso.

Era uma situação invulgar. Caminhando a esmo, seus pés o levaram a um pubzinho espremido (como quase todo estabelecimento comercial das entrequadras), sentou num banco sem saber o que pedir. Sentia um calafrio na espinha e no fundo do estômago, pensou em algo quente ou um gole de juízo. Não! Passara tempo demais bebendo daquelas coisas e já tinha sido seduzido pelo gostinho da loucura.

Sem "theme song", sem bebida ou drink, cem mil possibilidades e alguns dados na mão.

Alea jacta est.

sexta-feira, julho 27, 2007

O comportamento da vítima, da sociedade e do juiz

No dia 12 de março de 2007, três adolescentes entre 16 e 17 anos foram convidadas por Luiz Manoel e pelos irmãos Max e Michel para a casa de um deles. Eles ofereceram maconha e álcool. Elas aceitaram, mas uma recusou a droga. Entorpecidas, foram vítimas de estupro. Uma delas passou mal, sendo abandonada inconsciente na calçada, onde foi encontrada por populares. Outra, uma semana após a orgia, tomou larvicida. Antes de morrer foi ouvida pelo delegado da cidade de Simão Dias, Sergipe, disse que não tinha ocorrido absolutamente nada com ela. Posteriormente a polícia descobriu que Michel teve relações com Érica.

Michel e Max foram capturados em Salvador, Bahia, quando voltavam da noite soteropolitana, às 4h no dia 24 do mesmo mês, na frente do prédio onde estavam hospedados. Luiz apresentou-se à delegacia de Simão dias pouco depois, no dia 26. Mesmo sendo filho de políticos da região, não houve remédio constitucional ou recurso jurídico que permitisse responder o processo em liberdade. Ontem, quatro meses depois, foi julgado e indeferido o Habeas Corpus dos réus que dizia estarem sofrendo constrangimento ilegal em razão da ausência de fundamentação da decisão que decretou a prisão preventiva.

Dificilmente escaparão da condenação.

No estado de São Paulo, uma jovem, já adulta, vendo que seria inevitavelmente vítima de estupro, oferece preservativo ao agressor, que concorda e usa. No tribunal, o juiz acatou a defesa do réu que levantou a tese que, ao oferecer o preservativo, a vítima teria consentido com o ato, descaracterizado o crime. Segundo o promotor de justiça Rogério Sanches, de três julgados semelhantes, dois foram decididos dessa forma.

Isso significa que para ver uma condenação, a vítima tem que, além de sofrer a agressão, sofrer as conseqüências mais gravosas? Pune-se pela conduta ilícita ou pelas conseqüências geradas? Nos livros, até crimes sem resultado no mundo material (crimes formais) são punidos. Mas o que a prática forense tem ensinado?

domingo, julho 22, 2007

– Companheiro, lavagem simples! Não precisa lavar o motor nem passar cera, ok?

Num guardanapo, no assoalho de um carro:

"Olá

Hoje entrei no carro e, assim que liguei o rádio, tocou aquela música da Pitty de novo. É óbvio que rolou identificação. Não tem como... Minha mente tem atuado contra mim, ou, sei lá, o universo tem conspirado contra. Agora mesmo – inclusive estou escrevendo por causa disso –, sentei aqui na mesa do shopping e uma garçonete atravessou um cardápio na minha frente, aberto na página de sobremesas. Lá estava o teu pedido preferido. Acabei pedindo.

Mas a Pitty está errada. Eu nem estou procurando. Simplesmente acontece. Eu escuto o timbre da tua voz, o teu riso. Quando viro, você não está ali. No canto do olho eu vejo o teu cabelo, as tuas pernas. Quando eu presto atenção, não é você. Hoje está de um jeito que nunca vi! My tricky mind's day. Intraduzível.

Saquei... Hoje faz um mês. Está explicado. E se eu colocar no meu bolso e jogar em algum lugar esse bilhetinho, será que você vai conseguir ler? Do jeito que a coisa está, é bem provável.

Tenho que dar um jeito, antes que eu enlouqueça.
"

– Senhor, encontrei esse papel no chão.
– Não é meu, não. Pode jogar fora.
– Sim, senhor.
– Aliás... Não... Deixe! Pode jogar.

domingo, julho 15, 2007

Boa fé objetiva pós-contratual

Comprara seu carro e sempre esteve feliz com a aquisição. Por sempre, leia-se dois anos.

Enquanto ouvia o assistente-chefe, lembrava-se de que quando viera para a primeira revisão: o valor do óleo fora três vezes mais caro do que se fosse comprado em qualquer outro lugar. Naquela segunda revisão, a história contada não possuía o condão de trazer-lhe nenhuma felicidade: o valor da mão-de-obra era cinco vezes mais alto do que o valor de mercado e as peças a serem trocadas era pelo menos duas vezes mais caras.

"Pagar pela qualidade do serviço" não era um argumento muito convincente. Carros não era um assunto tão estranho para que ele não pudesse reconhecer tão flagrante usura! Já o segundo argumento daquele senhor de óculos de plástico o enfurecera: caso não fizesse as revisões na assistência técnica autorizada, a garantia de vinte anos na lataria contra ferrugem seria perdida e, conforme sua experiência técnica dizia, existia indícios de que, em três ou quatro anos, o carro iria precisar dela.

A questão agora é: contentar-se com o valor da causa limitado ao teto do juizado especial cível ou enfrentar o trâmite processual da justiça comum?

quarta-feira, julho 11, 2007

Maciel Pinheiro, 14:42

– Senhora, estou morrendo de fome, mas eu sou meio cismado com lugares que eu não conheço.
– Ah má nem se procupe! A gente são tudo limpinho aqui e usa discartáv já pru mode de num precisá limpá dispois.
– E a senhora só vende essa promoção de caldo e pastel a dois reais? Não teria alguma outra coisa mais...?
– Tem não, meu fi... Se quiser, cê fica só cum caldo ou só cum pastel.
– É que meu estômago é muito mole, com qualquer coisinha ele fica atacado.
– Ah! Mas tá tudo novinho. Se meu fi num quiser, melhor nem comer. Tá tudo novinho e num vai ofender, mas desconfiado, invez de atacar o estômbo, ataca logo o pissicótico! E o pissicótico ataca o estômbo.
– Sabe que por um lado a senhora tem até razão?! O ataque do psicótico deve ser fatal! Mas grande é fome! Tem de queijo coalho? Eu vou querer a promoção sim.

segunda-feira, julho 02, 2007

Round One. Fight!

E veio o dia da prova. 65 mil inscritos competindo por uma das 404 vagas anunciadas. Depois de empacotado todo equipamento proibido, entrou na sala quase lotada de estranhos, exceto por três rosto conhecidos. Dali, apenas oito tinham faltado. Toca a sirene, começavam as cinco horas de prova. Abaixou a cabeça e começou: questão 1.

Duas horas depois, levanta a cabeça. O ar-condicionado da sala tinha esfriado muito. Olha de lado e, das cinco fileiras, duas foram completamente esvaziadas, praticamente metade da sala tinha saído e nem percebera. Não havia "calor humano" suficiente para combater o frio que se propagava. Pediu para ir ao banheiro. Somente iria depois de três. Quando volta, mais gente tinha saído. Abaixou a cabeça novamente, fez uma tabelinha:

0
5h00
20
4h30
40
4h00
60
3h30
100
2h30
120
2h00
140
1h30
160
1h00
180
0h30
200
0


Precisava apressar-se, estava sete questões atrás do prazo, e o tempo para marcar o gabarito?

Fim. Agora tinha trinta minutos para fazer duzentas bolinhas.

Acabou às duas da tarde, com folga de quinze minutos, entregou o gabarito e saiu.

Chovia muito, mas estava muito cansado para correr e "quem vai para casa, não se molha". Foi. Chegou, comeu, deitou-se, mas, de tão cansado, não conseguiu dormir.

domingo, junho 10, 2007

The Windows Way

Essa história de baixar de graça uma imagem de CD do Fedora ou do Ubuntu pela internet não tem nada a ver! Prefiro pagar uma pequena fortuna e ter um DVD oficial da Microsoft. Nada de desktop tridimensional e essas várias firulas modernas, no Linux com 512Mb de RAM é possível, mas com 1Gb de RAM no Vista não é muito recomendável. Por falar em gigas, qual é a graça de ter um sistema completo que ocupe apenas 5Gb, ainda mais com os HDs de hoje? Muito melhor é ter o Vista que, sozinho, já ocupa 11Gb! Contando com outros programas como Office ultrapassa com facilidade os 15Gb. Com HDs de 40, 80, 160Gb, o que eu vou fazer com tanto espaço? A Microsoft tinha que me ajudar.

Essa coisa de também ter tudo num CD ou DVD só, não é muito minha praia. Prefiro ter um DVD para o Vista, outro para o Office, outro para o Editor de Imagens e outro para o Editor de Vetores e, claro, mais algum desembolso de dinheiro, porque, afinal de contas, eu preciso ter uma daquelas maravilhosas Centrais de Atendimento ao Usuário para resolver meus problemas tecnológicos. E se eu quiser outros programas? Basta ir no Google, clicar em vários links, vê se o programa é bom, ler os comentários dos usuários, e instalar. Nunca gostei daqueles repositórios do Linux onde basta pesquisar e pedir para instalar. Pior ainda se for num terminal, coisas do tipo: "apt-get install azureus", não tem absolutamente nenhuma emoção!

Qual a graça de baixar um pacote de codecs nesses repositórios infinitos do Linux? Assistir filmes, dvds, séries, etc é muito mais emocionante no Windows, afinal de contas, se não for possível encontrar no Google um pacotão de codecs, sempre podemos ficar testando um por um até que o Windows consiga ler o arquivo.

Se o sistema der problema em alguma coisa? Não carregar a placa de rede? Desaparecer um menu? Pegar vírus? Não tem problema! Basta reinstalar tudo do zero. Consertar uma coisa só, como no Linux é trabalhoso de mais. Formatar e reinstalar é que é o bom.

Afinal de contas, o que a gente tem para fazer da vida, senão vivê-la em função do computador?

terça-feira, junho 05, 2007

Bico: sábado a partir das 14h e domingo o dia inteiro

Gervásio é mecânico desde os 14. Aprendeu com o tio a diferença entre o que é um motor de dois tempos e um de quatro. Também é eletricista e encanador, se o dinheiro ficar curto demais. Nesses 12 anos de profissão, profissionalizou-ze também como pai, de seis: dois com a primeira mulher, dois com a segunda e dois com a terceira. Não acredita em casamento, nem em ajuntamento, nem em ficar amigado. Mora só, mas a irmã o ajuda com as crianças e ele a ajuda com um terço do que ele ganha do trabalho.

Ele já foi diferente. Já preferiu a paixão ao sossego e o gozo à certeza. Já houve tempo que era comum ver suas bochechas esconderem seus olhos no meio da gargalhada. Hoje está velho demais para rir com bobagem (faltam três semanas para completar 27). Só ri com os filhos, principalmente com os menores, quando começam a conversar com ele em idiomas estranhos.

O destino é pilantra, colocou a mulher certa cedo demais, com juízo de pinto, Lourdinha era muito nova quando engravidou do primeiro, o segundo veio quanto ela ainda tinha 16. Numa terça-feira ela resolveu que queria conhecer o mundo. Sumiu sem dar notícia. No ano seguinte, conheceu Vera, que quis cuidar das crianças mesmo depois que eles se separaram, mas quando descobriu que os 4 viviam na rua e todo dinheiro que ele mandava ela torrava na farra, não pensou duas vezes e pegou os meninos. Ano passado conheceu Mercês, no terceiro mês depois que se juntaram ela engravidou. Gêmeos. No sexto mês ele disse que iria viajar, passou um mês fora, precisava desparecer. Esse ano Mercês engravidou de novo, foi quando ele contou que tinha feito vasectomia, no mês que estivera fora.

terça-feira, maio 29, 2007

Cego

Escuro
Tateio
Macio
Quente
Úmido
Molhado
Perfume
Cheiro
Respiro
Farejo
Provoco
Provo
Gosto
Doce
Salgado
Amargo
Sussurro
Escuto
Mais
Mais
Mais

domingo, maio 27, 2007

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Então estavam os irmãos discutindo:
– Eu não sou exagerado!
– É claro que é! Todo mundo sabe disso!
– Então prove!
– Provo!
– Ah é? Então me dê vinte exemplos!

Anos depois:
– Não sabe o que eu descobri!
– ...
– Olha: 2*10^1024
– ...
– Poxa... É que o Google pode ser usado como calculadora. Olha aqui os exemplos no Search.
– E não deu justo com o exemplo que você deu, né?
– Deu certo com 2^1023!
– Tu só escolhe número pequeno, né? Só faltam mais 18 exemplos.

sexta-feira, maio 25, 2007

Arrodeando a quadra

Rudolph ganhou esse nome por motivos óbvios. Quando sua dona, minha esposa, viu aquele nariz sem melanina dentro da ninhada, não teve dúvidas, queria aquele. Tornou-se um filho pra ela, desde quando namorávamos. Hoje é, por assim dizer, meu enteado. E pago o preço da liberdade que lhe demos: o bicho dorme dentro do quarto e, por volta das seis e meia, pula na nossa cama. Mas como minha mulher é meio preguiçosa, acaba sobrando para mim. Tenho que passear com ele, senão o danado passa o dia perturbando.

terça-feira, maio 22, 2007

30 minutos de banho de sol

Ele virou refém de Greta, sua beagle. Todo dia, pontualmente às 6:40, ela puxa o lençol da cama e lambe seu pé até acordá-lo. Então ele se levanta, leva a menina para passear e, coincidentemente, encontra com um outro dono de beagle.

domingo, maio 20, 2007

Explodindo o último caroço

Pipoca se faz no fogão, na pipoqueira.
Não há pacote ou microondas que me supere.
Salgada ontem. Doce hoje.
Satisfação barata.
Quem não quer?

quinta-feira, maio 17, 2007

O que fazer

quando as meias já não adiatam e não há mais opções para esquentar os pés à noite?

quando a mente não relaxa, colocando-se numa maratona de flashbacks?

quando o que você mais quer é o que você não quer?

sábado, maio 12, 2007

Virose

Você vai dormir pensando que gripou e acorda mal, rejeitando qualquer coisa que bate no estômago até que desiste de comer. Você não percebe que está com febre, nem se toca. Então começa a ficar tonto, delirar, gemer, ter vontade de chorar, achar que enlouqueceu...

Mas pior seria se você não tivesse para quem ligar.

quarta-feira, maio 09, 2007

PEC 54

Tenho acompanhado a PEC-54/1999¹ e ontem recebi um email com sua movimentação. A proposta é incluir o seguinte artigo no Ato das Disposições Transitórias:

"Art. 76. O pessoal em exercício, que não tenha sido admitido na forma prevista do art. 37 da Constituição, estável ou não, por efeito do art. 19 do ADCT, passa a integrar quadro temporário em extinção à medida que vagarem os cargos ou empregos respectivos, proibida nova inclusão ou admissão, a qualquer título, assim como o acesso a quadro diverso, ou a outros cargos, funções ou empregos."
Isso legaliza, até a aposentadoria, todos os que estão em situação irregular às custas do erário.

Qual não foi a surpresa, não apenas um, mas dois deputados apresentaram requerimento para "inclusão na Ordem do Dia da Proposta de Emenda à Constituição nº 54": o Deputado Rômulo Gouveia (PSDB-PB) e o Deputado Clodovil Hernandes (PTC-SP).

Conheço a ambos apenas por suas notórias carreias, não possuo nenhum elo pessoal, mas como o primeiro é da terra onde estão fincadas minhas mais profundas raízes, senti-me obrigado a enviar-lhe um email.

**Update: Ontem, 09/05/2007, o Deputado Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB) e o Deputado Davi Alcolumbre (DEM-AP) fizeram tambem requerimento. O primeiro é muitíssimo conhecido aqui no estado, tem uma carreia política desde de quando eu me entendo por gente. Modifiquei um pouco o email e enviei-lhe meu protesto.
Excelentíssimo Senhor Deputado Ronaldo Cunha Lima,

É com muita tristeza que tenho observado esse esforço em aprovar uma proposta de emenda à Constituição que tem como fundamento a perpetuação de uma realidade de ineficiência ao serviço público em detrimento do direito à isonomia. Sobretudo quanto existe um método legal, previsto na Constituição da República que dá igualdade de oportunidade para todos e que promove o preenchimento do quadro de funcionários públicos através da seleção de pessoas tecnicamente melhor preparadas para o múnus público.

O concurso público consagrado no artigo 37 da Carta Magna como requisito do servidor é, ao lado da licitação, a expressão mais forte dos princípios da administrativos da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Esta proposta de emenda à constituição afronta a praticamente todos esses. Ao da legalidade criando uma regra de exceção para manter uma situação de irregularidade; ao da impessoalidade, favorecendo poucos em detrimento de muitos; ao da moralidade, preservando o que na própria fundamentação da PEC chama de "fardo" de governos passados que "nunca são alcançados nem responsabilizados", conforme o texto; ao da eficiência, deixando de selecionar um cidadão mais preparado para desempenhar a função conforme critérios objetivos. E ainda mais, mostra o descaso com a coisa pública preservando essa situação até que todos os cargos e empregos voluntariamente seja vagos.

Com toda a vênia, o propositor da PEC, ao defender que "numerosos contingentes de servidores em geral, das mais diversas categorias e níveis profissionais, ocupantes de cargos ou empregos, ou, mais comumente, contratados temporariamente, mas cujo vínculo, juridicamente, se tornou por tempo indeterminado (...)" possa ser justificativa para esta norma, somente reflete má vontade do administrador ao deixar de promover um concurso, que não trás absolutamente nenhuma despesa, visto o excepcional número de concurseiros lutam por uma ou duas vagas a cada oportunidade que se abre pelo país, tornando a publicação do certame praticamente uma expectativa de renda ao ente público promotor do concurso.

E o que ainda mais me entristece é ver um deputado da minha terra, conhecedor do mundo jurídico, que sabe perfeitamente que no direito administrativo não existe elo jurídico fora da legalidade entre particular e administração, que conhece a realidade de um estado que vive arrastado com funcionalismo público arcaico e ineficiente e, que, consciente de todos esse fatos, atua de forma promover um verdadeiro bloqueio à modernidade desta nossa terra.

Oxalá Vossa Excelência reconsidere as razões dessa PEC materialmente inconstitucional e mostre-se fiel ao ao propósito de construir uma sociedade livre, justa e solidária.

Cordialmente,
Esse não é meu primeiro email enviado a um político e nem será o último, independente da resposta que eu tenha (ou do provável silêncio), ao menos tenho a conciência de cumprir o mínimo do meu papel de cidadão.


¹ A fundamentação e o dispositivo da PEC estão nessas páginas: 1, 2, 3 e 4.

quinta-feira, maio 03, 2007

Shiatsu, sexta, às 18:40

Alan, como de costume foi dormir às 3:30 da manhã, já não agüentava mais aquela jornada de 4 turnos intercalando entre trabalho, bico e estudos. Dizia que não agüentava, mas agüentava sim.

Acordou às 7:00, podia ter dormido mais uma hora, mas o telefone não deixou, tinha coisas para fazer durante o dia que fugiriam da rotina normal. Levantou-se e foi lá "matar o dragão nosso de cada dia" – como ele dizia. No carro, lembrou que não tinha se despedido da mulher... depois a encontraria.

Fugir da rotina pode ser um alívio, mas não quando se tem mais trabalho. Não quando se fica preso num engarrafamento e só se tem 20 minutos para vencê-lo. Olhou para o relógio, tombou a cabeça – frustração –, deparou-se com a barriga – mais frustração –, lembrou-se do livro que tinha parado de ler, do exercício para o qual não tinha mais tempo, da meditação que costumava fazer, dos relatórios pendentes – tudo atolara no meio das urgências. O pescoço e as costas doíam. Tensão. "Normal, vai passar", pensava, como que se consolando.

Às 2:30 da madrugada, os ombros latejavam de dor, não dava para ler mais nenhuma página. Aproveitou para dormir mais cedo. Deitou na cama. A dor afastava o sono. Tinha esquecido de comprar Dorflex. A cabeça também doía. Tinha que dormir, já passava das 4:30. Foi na cozinha, encheu sacos de gelo e deitou os ombros sobre eles. Alívio. Dormiu, e era 5:30.

Quanto o sol bateu-lhe a janela, acordou tão tonto que mandou a manhã de trabalho se danar, tomou uma aspirina para matar a dor de cabeça que estava retornando e voltou a dormir. Acordou às 13:18, com pouca dor no pescoço.

Do outro lado da cama, um bilhete:

"Espero que depois a gente se encontre.
Beijo,
Chris"

O próprio Alan assumiu a culpa daquele bilhete, quem suportaria aquele ritmo senão ele? Mas, afinal de contas, quando ele iria ceifar os frutos daquelas batalhas?

– Beijo, amada, também espero.

Beijou o bilhete e guardou-o. Desligou o celular e tirou aquela quinta-feira de folga.

segunda-feira, abril 30, 2007

Conflito de Gerações

Quanto eu era moleque, diziam que eu não fazia nada da vida. Por isso eu tinha que lavar os carros da casa, dar banho nos cachorros, ajudar na loja, ir na padaria, tirar 10 em todas as matérias e não faltar as aulas de natação, inglês, vôlei e basquete.

Daí eu cresci um pouco mais e deixei de ser moleque, mas continuava não fazendo nada da vida. Por isso eu tinha que lavar os carros da casa, dar banho nos cachorros, ajudar na loja, ir na padaria, passar no vestibular e não faltar as aulas dos cursos preparatórios.

Envelheci um pouco mais e continuava não fazendo nada da vida. Por isso eu tinha que cuidar das contas da república (porque não tinha nenhuma pessoa com responsabilidade suficiente), lavar os carros da casa, manter-me no estágio, manter o CRE alto, e juntar dinheiro para a formatura.

Não custou muito e virei adulto, desempregado e concurseiro, praticamente um vagabundo que não fazia nada da vida. Por isso, tinha que fazer quase tudo que os outros ocupados da casa não tinham tempo para fazer (como por exemplo, ficar disponível o dia inteiro do último dia de entrega do IRPF), enquanto eu não passava em algum concurso. Com toda convicção, foi o período mais infeliz da minha vida.

Encurtando a história, finalmente eu fiquei velho o suficiente para aposentar-me, e, como aposentado, não fazia nada da vida. Por isso, tive que ser "taxista" de meus netos, babá, "office-voinho" (segundo minha netinha), entre outras coisinhas que meus filhos sempre foram atrapalhados demais para lidar com elas.

Agora, cá comigo, fico me perguntando: será que no céu eu vou fazer alguma coisa da vida?

terça-feira, abril 24, 2007

Sem tempo para pensar muito

Com uma assinatura o Limbo desapareceu. Todas as pessoas que viveram antes da Igreja Católica, todos os bebês não batizados, entre outros, pegaram sua senha para saberem qual será seu próximo destino eterno (ou até a próxima edição da reforma dogmática católica). Tinham lugar próprio e agora entraram numa fila de onde podem ou não ir para o céu conforme a vontade de Deus.

Dogmas e paradigmas são importantes, poupam-nos de pensar. Imagine se eu ficasse raciocinando a cada ato ou gesto? Nunca conseguiria desenvolver reflexos suficientes para dirigir; para escolher o que comer ou beber; ou para reprovar um alimento, dizendo que está estragado.

E por falar em comida, descobri ontem que "bebida" não é alimento. Alimenta, mas não é alimento. Soube isso de fonte segura: uma engenheira de alimentos com especialização em bebidas lácteas. E depois dizem que o Direito é algo complicado, essa senhora é a personificação do paradoxo.

Para alimentar o paradoxo do mundo, saciar o meu vício e mostrar que, de fato, a escolha é uma ilusão, não tive outra opção senão ir ao Manu Laches pedir um suco de açaí. O processo é muito simples: 1º chamo o atendende; 2º digo que quero um suco de açaí com banana e leite; 3º bebo; 4º chamo-o novamente; 5º pago. É simples se você não pensar em tudo o que você fez.

Na verdade eu realizo um contrato de compra e venda regulado pelo Código Civil e pelo Código de defesa do Consumidor. Essas duas leis regulam exclusivamente a obrigação, ou seja, o ato negocial. Existe ainda outros dois atos normativos que tratam exclusivamente do bem: uma lei que dispõe sobre a padronização, a classificação, o registro, a inspeção, a produção e a fiscalização de bebidas, autoriza a criação da Comissão Intersetorial de Bebidas e dá outras providências e um decreto que regulamenta a Lei nº 8.918, de 14 de julho de 1994, que dispõe sobre a padronização, a classificação, o registro, a inspeção, a produção e a fiscalização de bebidas.

Pois bem, aquilo que foi convencionado entre as partes como "suco de açaí com banana e leite", na verdade não é suco, segundo o regulamento:

Art . 40. Suco ou sumo é a bebida não fermentada, não concentrada e não diluída, destinada ao consumo, obtida da fruta madura e sã, ou parte do vegetal de origem, por processamento tecnológico adequado, submetida a tratamento que assegure a sua apresentação e conservação até o momento do consumo, onde:

I - o suco não poderá conter substâncias estranhas à fruta ou parte do vegetal de sua origem, excetuadas as previstas na legislação específica.
Como não existe legislação específica para o açaí, ficamos com o regulamento geral. Não é caso nem de suco tropical, que pode ser obtido com adição de água, a menos que eu tivesse pedido sem açaí e sem leite:
§ 6o Suco tropical é o produto obtido pela dissolução, em água potável, da polpa de fruta polposa de origem tropical, não fermentado, de cor, aroma e sabor característicos da fruta, através de processo tecnológico adequado, submetido a tratamento que assegure a sua apresentação e conservação até o momento de consumo.
O açaí, para quem não conhece, é um caroço envolvido com uma película comestível, se não tivesse a banana e o leite, seria um néctar.
Art . 43. Néctar é a bebida não fermentada, obtida da diluição em água potável da parte comestível do vegetal e açúcares ou de extrato vegetais e açucares, podendo ser adicionada de ácidos, e destinada ao consumo direto.
Se não tivesse leite, poderia ser refresco.
Art. 44. Refresco ou bebida de fruta ou de vegetal é a bebida não gaseificada, não fermentada, obtida pela diluição, em água potável, do suco de fruta, polpa ou extrato vegetal de sua origem, com ou sem açúcar.
Imagine que o regulamento trata dos refrescos de laranja, limão, maracujá, guaraná e maçã, informando a concentração mínima para garantir que aquilo é refresco, e o açaí? Nada.

Pois bem, se eu não estivesse com a lei em mãos, não saberia o que bebi:
Art . 57. Bebida composta de fruta, polpa ou de extratos vegetais é a bebida obtida pela mistura de sucos ou extratos vegetais com produto de origem animal, tendo predominância, em sua composição, de produtos de origem vegetal, adicionada ou não de açúcares.
Depois de tanto tempo, a palavra "acréscimos", no cardápio, foi finalmente corrigida, quanto tempo vão levar para corrigir a palavra "sucos"? Existe pouca probabilidade de acontecer, mas seria bem possível que, com uma assinatura da autoridade competente, o cardápio do Manu Lanches ficasse correto.

Pois bem, amanhã vou tomar uma tigela de açaí com banana, granola e amendoim. E não vou gastar nenhum pulso neural para descobrir o que vão me servir. Vou querer uma tigela dogmática grande.

domingo, abril 15, 2007

O Máximo

Hoje ele percebeu o que ela representava. Amava-a de um jeito estranho, mutante, impreciso. Se aquilo que sentia pela mulher não fosse "amor", quem importaria o outro nome daria?

Era admirável em inteligência e graça. Motivo para encher a boca e dizer aos mais próximos (e aos estranhos) seus sucessos. Gostava de criar expectativa nos outros em conhecê-la.

Libido, lascívia, talvez a própria loucura, transformavam-na em presa a ser devorada com unhas e dentes ou apreciada lentamente: o aroma particular, o gosto salgado, o corpo quente.

Em outros momentos, ignorava sua força. Via-a frágil. Não suportava vê-la fazendo esforço (mas sabia que quando não estava, ela fazia tudo). Mesmo a irritando, dizia era tarefa dele.

Num dia, ela adoeceu. Mimou-a de todo jeito. Dengos e cafunés. Tratava-a como a uma filha. Mandava tomar os remédios, sair do sereno, comer melhor, não pisar no chão frio... um saco.

Adorava seu colo. Passaria horas ali: sentindo o cheiro do hidratante nas pernas, as mãos macias alisando a cabeça... Foi numa hora dessas que ela disse algo, que só depois de muitos dias ele entendeu: "você é muito egoísta".

segunda-feira, abril 09, 2007

Indivíduo Legal

Há quase dois anos atrás, escrevi aqui sobre um assunto que o Paulo tangencia, o aborto. Mais precisamente envolvendo o feto anencéfalo. Eis que o tema volta à tona com a primeira audiência pública da história do Supremo na ADI que contesta Lei de Biossegurança.

Para fins de transplante de órgãos, pode-se dispor do cadáver no momento em que é constatada a morte cerebral, que é a perda definitiva e irreversível das funções do órgão. Nesse ponto, acredita-se que cessa a existência consciente do indivíduo. Perceba que, neste instante não está sendo questionado se o que "sobra" está ou não vivo, mas a matéria orgânica estará livre à disposição médica.

Partindo do pressuposto que se pode dispor do corpo humano para a doação dos órgãos com a morte encefálica, independente que "uma vida" comece ou termine em qualquer ponto, o mesmo critério deveria ser adotado para determinar o início da impossibilidade de dispor do corpo humano para a finalidade que seja.

Em outras palavras, se a utilização depende da existência ou não de atividade cerebral, isso não significa, necessariamente, o momento que o feto chuta, nada, ou faz gracinhas que provocam o riso ou tiram o sono das gestantes. A atividade pode iniciar anterior à formação de um pé ou uma mão que toque a parede do útero. Se foi possível apontar o fim da existência corpórea e o início da disposição do tabernáculo carnal, podemos e devemos usar o mesmo paradigma para demarcar o começo, a contrario sensu, por lógica, sem a necessidade se ater a uma questão tão filosófica quanto o "início de uma vida humana". E agora, fico me questionando, ante a flagrante ausência no rol dos 17 especialistas convocados pelo STF, por que nenhum filósofo pediu sua admissão como amicus curiae, independente de convite?

Do ponto de vista do Direito Penal. O nosso Código protege a vida intrauterina. Pouco importa se um indivíduo vivo está se desenvolvendo, por exemplo, numa das trompas. Assim, põe-se a salvo o direito de aniquilar uma ou mais vidas antes da nidação. Logo, não podemos sequer falar em abortamento e muito menos em assassinato. Pode existir morte provocada por terceiro sem ocorrer um ou outro. A morte é um fato da vida. Se o STF decidir que seu início precede ao 14º dia a partir da concepção, ainda assim, até o 13º dia poderá ser destruído o óvulo fecundado e, a qualquer tempo, interrompida a gestação tubária sem tipificar crime de aborto. Poderá, contudo, ser dilatado o prazo para a intervenção se for verificada que a vida – e, nesse caso, prefiro o termo "existência" – do indivíduo é posterior ao que o Direito Penal construiu em sua jurisprudência como bem a ser protegido porque, ao proteger a vida intrauterina, já não basta estar no útero, mas sim, estar vivo, dentro dele.

Leia Mais...

quarta-feira, abril 04, 2007

Interesse Coletivo

faz parte do Google Labs – o playground tecnológico do Google – é um analisador de buscas, um "Top Of Mind" da internet. Desde que o Google se transformou na ferramenta de busca hegemônica dá para se ter uma boa idéia do que as pessoas buscam na rede. Pois bem... com esse "brinquedinho", qual seria o meu primeiro teste? Nem pensei duas vezes:

debian ubuntu redhat suse fedora

Resultado previsível (e triste para a Red Hat), mas pouquíssimos leitores saberiam do que se trata. O que seria mais "familiar"?

firefox safari opera internet explorer

Muito nerd. O que seria mais comum? Inglês?

sex women beer porn

E os que falam português?

sexo mulher cerveja porno

Agora sim, algo interessante. Enquanto os falantes da língua inglesa preferem as coisas de forma bem variada e buscam o sexo mais do que tudo; para os que falam português, pornô é mais interessante que o próprio sexo, depois, o resto... Bem... Quem se importa com cerveja?

Ok, vamos elevar um pouco o nível:

bom justo belo ético

É uma pena que o que é ético e o que é justo não são tão populares quanto o que é bom e o que é belo. E os próprios valores? Afinal de contas, há uma grande diferença entre uma coisa que é, e a própria coisa. Qual a popularidade desses valores mais elevados?

Your terms - bondade, justiça, beleza, ética - do not have enough search volume to show graphs.

Suggestions::

  • Make sure all words are spelled correctly.
  • Try different keywords.
  • Try more general keywords.
  • Try fewer keywords.
  • Try viewing data for all years and all regions.

Estamos perdidos...

domingo, abril 01, 2007

Tchau, vocês!

Blogar toma um tempo que eu não tenho.
Há tanto para fazer e tão pouco tempo.
Se fosse tentar fazer tudo o que quero...
Teria que, primeiro, congelar o tempo.
Esse vetor inescapável que nos prende.
Posso eleger prioridades, selecionar...
Administrar o tempo, criar uma rotina.
E quem sabe assim não maximize a vida?

Por isso decidi, de forma irremediável.
Blogar toma um tempo que eu não tenho!
Nem sequer está em nenhuma "To Do List".
Já falei demais, prefiro mudar o tom:
"Muito obrigado a todos, valeu mesmo!"
Quem sabe um dia postarei algo de novo?
Um conto ou notícia. Mas, por ora: adeus.

quarta-feira, março 28, 2007

To Do List (In God Mode)

– Arrumar um emprego de verdade
– Aumentar a rotina de estudos
– Conhecer a Europa como mochileiro
– Encontrar um bom livro de Direito Empresarial
– Entrar no mestrado
– Matricular no alemão e no italiano e esquecer (por ora) o japonês
– Ser um bom marido
– Ser um bom pai
– Terminar as aulas de Libras
– Terminar de assistir Battlestar Galactica, Dead Zone, Heroes, Lost, Smallville e Veronica Mars
– Terminar de ler os livros de Arthur Conan Doyle, Douglas Adams, Homero, Platão, e Tolkien
– Terminar Max Payne II e Warcraft III
– Terminar o curso de Kite e de Widsurf
– Voltar a acampar
– Voltar a controlar os gastos com o GNUCash
– Voltar ao ministério
– Voltar ao projeto do manual do CDC para pequenas e micro empresas
– Voltar a surfar de verdade


Em ordem alfabética, just for the fun of it.

quarta-feira, março 21, 2007

Travessia

Todo mundo conhece a fama das faixas de pedestres em Brasília. Independente de semáforos, pedestres conseguem parar o motorista mais apressado com um simples passo.

Depois de muita multa e guardas estrategicamente posicionados nas faixas de João Pessoa, hoje posso calcular o espaço para frenagem, acenar e cruzar ao som de xingamentos de nossos obedientes motoristas.

Todavia, a aventura mora em Curitiba (aonde passei esse fim de semana). Aproveitei para usar as faixas sulistas. Fui advertido que as únicas confiáveis eram as dos semáforos vermelhos, 10 segundos após fecharem. Pensei: "ok, estou acostumado a motoristas que cruzam sinais amarelos". Enquanto eu esperava, duas senhoras conversavam sobre um acidente com um biarticulado: "...foi criança pra tudo quanto é lado. Ainda bem que a babá não resistiu, não quero nem imaginar o que a família faria com ela...".

"Vermelho! 1, 2, 3, 4, ... ,10. Ok!" – cruzei são e salvo. Olhando para trás, vi um senhor lento demais. Fui socorrê-lo. Tomei-o pelo braço e seguimos. Já estávamos quase na metade quando abriu. Buzinas berravam à nossa esquerda e na segunda faixa os carros já passavam à 80. "Como dizia um antigo filósofo: Retroceder nunca, render-se jamais. – Avancemos, vovô!". Não sei se a melhor escolha, mais foi assim que consegui fazê-lo andar.

O problema foi ao chegar exatamente no meio...

Ambas as vias ventavam sobre nós e por pouco um automóvel não levou meu aceno que teimosamente tentava convencê-lo a parar. Dois longos minutos se passaram até o semáforo garantir nossa passagem pela Sete de Setembro.

"Vovô, coragem, só falta a pista do biarticulado e mais outra dessa. O senhor também vai ao Shopping Estação?"

Ele disse "sim".

segunda-feira, março 12, 2007

Sombras de Platão

Minha primeira experiência marcante com o cinema foi sentado num tamborete de madeira. Meu avô tinha tubos de desenhos, em sua grande maioria do Pica-pau. Assisti a dezenas deles na parede do fundo de sua garagem. Sem fazer muito esforço, consigo lembrar do barulho do projetor, daquele "tec-tec-tec" do filme passando. Assim como das chicotadas que a película dava no projetor no final do rolo. Daí, vovô seguia a colocar o próximo dizendo: "você não pode ligar a lâmpada com a máquina parada, senão queima a película".

O tempo foi passando e assisti a um longa que não sei se era triste. Nele, vi salas gigantescas reduzindo o tamanho, e centenas de acentos pouco anatômicos transformando-se em algumas dezenas de cadeiras super-confortáveis. A tela continuou diminuindo. O número de cadeiras, reduzindo. Quando percebi, a tela era meu monitor e eu estava sentado na única cadeira disponível.

Noutro dia, sentado num sofá ultra-acolchoado, assisti na parede do fundo da sala de um amigo a um filme que não me traz nenhuma lembrança, exceto a sensação do som fluir por todos os lados e vibrar nas paredes do meu estômago cheio de pipoca e coca-cola a cada explosão. Não havia nenhum "tec-tec-tec" e, ao final do filme, não ouvi som de nada estalando. Apenas apareceu uma tela branca e, no topo direito, uma seta informando "eject". Meu amigo tirou o disco do aparelho com tanto descuido que, se meu avô tivesse ali, certamente daria-lhe bronca.

Nessas décadas, imagem e som vêm aperfeiçoando a experiência do cinema, mas, diferente do que pensava meu avô, a coisa mais sagrada não é o objeto corpóreo. Ele sempre foi para mim um pretexto. Era um motivo para que tivéssemos alguma coisa em comum. Compartilhar de uma companhia inestimável assistindo a cupins marcianos serem transformados em apontadores; ou conversar sobre a impressão que tivemos ao ver uma caveira flamejante desrespeitar o devido processo legal.

terça-feira, março 06, 2007

Os puxões de orelha de dona Lissandra

Minha bisavó casou com 16 anos. Criou seis filhos dos oito que teve. Não se abalou com o natimorto, nem com o que morreu com três semanas, vítima de infecção. Nesse tempo não se tinha muito o que fazer da vida. Era estudar, trabalhar, casar, criar os filhos e morrer em paz. Sabendo que não me veria mais, aproveitou minha visita e confidenciou-me: "Fui feliz com seu bisavô por 73 anos. Certa feita, ele me preparou um jantar a luz de velas para comemorar nosso aniversário. Quando ele foi me beijar, subiu uma labareda da gravata. Ainda me pego sorrindo com essa lembrança. Sempre tive que tomar conta daquele menino desastrado. Você puxou a ele – não sei como continua solteiro – preciso encontrar alguém para cuidar de você! Perca tempo não. Seja feliz."

quarta-feira, fevereiro 28, 2007

O nome do jogo

– Tua vez.
– Tu joga muito trancado! Vou abrir esse jogo.
– 'Ce que sabe.
– Vai! Tu demora demais...
– Xiu! Seqüestro-relâmpago. Pegaram Seu Tota. Tua vez.
– Tô vendo. Mas a loja dele nem tá essas coisas...
– É. Dama.
– Misera!
– Tá. Joga. Por que sempre saem cantando o pneu?
– Eu que sei? Viram muito filme. Sopro! Perdeu a dama.
– Opa, que isso aqui tá ficando perigoso!

sábado, fevereiro 24, 2007

It's up to you

Não era mais que 15:20, quando se perdeu entre "Despesas de escritório" e "Material de limpeza" no último relatório do mês. Se perdeu tão profundamente em seus pensamentos que já não via mais a mesa ou as pilhas de papéis. Viu, em milhares de telas, cenas da sua vida. Percebeu que alguma coisa tinha mudado nos últimos meses e não sabia o que era, mas o que quer que fosse tinha tirado sua poesia, suas gargalhadas, seu brilho. Não se sentia triste, nem feliz, nem satisfeito, nem miserável. Não sentia nada naquela rotina de casa-trabalho-casa. Ou seria trabalho-casa-trabalho? Estava trabalhando demais, mas... ok. A man's gotta do what a man's gotta do.

Despertou-se do sonho, com a mão da Morte em seu ombro.
– Hoje você vem comigo.
– Ok.

A Morte hesitou. Sentia um prazer levar almas entre gritos e choros. O desespero era a parte revigorante do seu trabalho. Mas também via com candura aqueles que ela levava que já estavam sofrendo demais, afinal de contas, a vida deve ser vivida. Considerava-se misericordiosa, o que não era o caso ali.

– Você não passa de hoje. Acabou. Sonhos, desejos, projetos, tudo.
– Uhum.

Irada, deu as costas. Sentiu-se insultada. Veio tirar a vida de alguém que já não a tinha. Deprimente.

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Num canto onde o bom, o belo e o justo não tem valor

Lá estava eu, tranqüilamente lendo o Informativo 454 do STF sobre a Rcl 4.335/AC. O voto do relator, o Min. Gilmar Mendes, defendia que o julgado HC 82.959/SP onde decidira que a Lei 8.072/90, no §1º do artigo 2º, vedando a progressão de regime era inconstitucional e tinha efeito erga omnes. Esse habeas corpus já tinha aparecido nos Informativos desde o 315 – tratando da descaracterização do estupro e do atentado violento ao pudor sem lesão grave e sem morte como crimes que não deveriam ser enquadrados como hediondos. Antes de terminar a leitura, fui interrompido por uma muvuca bastante perturbadora no outro da rua, na frente da granja onde eu estava.

Acredito que o bicho devia estar ou possuído ou tomado pelos instintos mais animalescos. O fato é que ele corria insanamente atrás de uma infeliz que, obviamente, fazia de tudo para livrar-se. Enquanto um corria calado, a outra, correndo, gritava num desespero terrível e constrangedor. Até tive vontade de apartar os dois, mas como a coisa não era para o meu bico, fiquei inerte observando.

Deve ter demorado entre quinze minutos a meia hora a perseguição, quando finalmente ele consegui dominá-la, agarrando-lhe o pescoço. Completamente subjugada e encostada num muro com uma tela de arame, deixou ser pisada como se fora um tapete. Ficou imóvel enquanto ele preparava o caminho. A cópula em si demorou poucos segundos e logo depois o macho voltou a caminhar entre seus pares; mas ainda demorou pelo menos uns dez minutos para a gansa sair daquele canto.

Os homens têm se distanciado da natureza.
Não todos.

sábado, fevereiro 17, 2007

Tempo demais para dizer adeus

Quando morria alguém, tínhamos o costume de perguntar se fora de morte matada ou de morte morrida. Se fosse de morte matada, as próximas perguntas seriam sobre o autor e sobre o fatídico. Um mais curioso poderia ainda questionar se já pegaram o sujeito. Sendo de morte morrida a única pergunta que poderia se fazer era de que tinha sido, o que trazia as mais diversas respostas: de coração, de velho, de susto, de desgosto, de um baque, morria-se de todo jeito e sempre subitamente.

Hoje não. Tirando os acidentes e as mortes matadas, a ciência, quando não cura, fica infernizando-nos por meses a fio: será de câncer, será de coração, serão poucos meses. Enquanto os remédios contra dor nunca fazem efeito.

Descanse em paz e que Deus console os que ficaram.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Tá afim de ir para o Universo Paralelo?

– Nada disso é real, Jamil vivia em outra realidade.
– Isso não é privilégio dos loucos, cada um de nós vive uma diferente. É somente na colisão de realidades que nasce o conflito, não no contato. A forma como isso se dá define o nosso convívio, mas nem sempre o choque é fatal.
– O quê, doutor?
– Perdão, nada... elucubrações apenas.
– Agora que o senhor disse, tava achando muito louco mesmo.

Esboçou um sorriso simpático no rosto, próprio dos ignorantes. Eu não tinha tanta certeza qual era seu nível de ignorância. Astúcia e ignorância não se excluem, podia ser o caso. Jamil tinha dito que ela se assustava com qualquer coisa, um tiro na rua, gente correndo à noite. Mas quando ele recebeu a primeira carta, a hipótese de estar sendo ameaçado não a abalou. Por isso, ele suspeitou que tivesse sido fabricada por ela. As que vieram depois eram bem diferentes, e continuava suspeitando. Ou a esposa estava se aperfeiçoando na arte, ou tinha contratando alguém para o serviço. No dia que picharam seu muro, ele que temeu. Ligou para o batalhão e vieram pegá-lo com uma viatura. Frente ao corpo, não estava abalada, todavia, os braços cruzados e os ombros encolhidos mostravam que estava visivelmente tensa.

Na sua versão, ela tinha escrito um bilhete, para ele apressar a separação e sair dali. Queria trazer o namorado para casa. Com ele ali, não dava. Constrangimento, talvez. Jamil era fiel, e o que levou ao afastamento foi a falta de carinho, depois é que veio o "abuso da pessoa". O que não significava que desejaria sua morte. O problema se deu quando muitos souberam dessa carta. Isso deu oportunidade para qualquer inimigo manter a história e dar cabo dele. Afinal de contas, não falta bandido querendo matar PM.

Jamil era burro. Sua esposa – pela carta – também foi.

Eu preferiria os honorários de um divórcio – dinheiro rápido e tranqüilo – por mais tumultuada que fosse a audiência na vara de família. Entretanto, penal paga melhor, vendo por esse lado...

O trabalho agora é mudar um pouco a realidade. Fazendo com que ela não colida com a do delegado.

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Nunca mais digo que odeio gente burra

Baixou a cabeça, como se tentasse concentrar-se, lembrando dos eventos que culminaram naquele momento, e possivelmente de outros que vêm sem licença à mente nessas ocasiões, formando o que chamara de "miserável existência", não conseguia chorar. Ao contrário, seus olhos estavam ardidamente secos pelo que pude ver. Olhou para mim e para o chão e apenas meneou a cabeça.

Jamil era uma boa alma, apesar de burro.

Ele me procurou por acaso. Estava na OAB de passagem só para deixar uma petição já que era o último dia do prazo, nesse período de recesso forense em que todos estão na praia, curtindo um kite com esse vento espetacular de 20 nó. Todos, menos eu. Ainda lembro como pacientemente o ouvi, desde sua decisão de levantar uma parede dividindo sua casa até sua odisséia forense, passando pelos bilhetes com ameaças àquele PM que jurava serem fabricados pela mulher que queria a casa para si somente. Após duas horas de conversa fiz tudo o que poderia ser feito a um possível futuro cliente num dia de sol com ventos de 20 nó: tentei dissuadi-lo a permanecer em casa – que ele não iria perder se saísse –, dei meu cartão e sublinhei os telefones, colocando atrás o nome e o telefone do meu sócio.

Honorários de advogado assustam, mas depois de sofrer uns meses nas mãos de defensores sobrecarregados de processos as pessoas acabam se rendendo a um procurador particular, pensei assim que recebi a chamada da esposa de Jamil, querendo que eu viesse à sua casa.

Jamil era burro, mas sua esposa não.

Entrando na sala, ela dizia que sempre reclamou que ele não trazia mais flores e cartões, vindo para casa apenas com feira e cansaço até que quem cansou foi ela e deixou-se levar por um "novo amor". Enquanto caminhávamos por um estreito corredor, deduzi que uma das paredes era a tal divisória, ouvindo-a reclamar que ele tinha espalhado pelos quatro cantos uma história de bilhetes para difamá-la. Somente quando chegamos no quarto, ela se calou.

Agora, parados ali, frente ao morto, percebi o quanto a burrice pode ser fatal.

domingo, janeiro 28, 2007

E quem disse que Marx era marxista?

"Só os incautos poderiam acreditar que o presidente algum dia cedeu aos flertes do marxismo. Lula já rejeitava o marxismo em seu discurso de posse no Sindicato dos Metalúrgicos, em 1975. Ele disse literalmente que 'parte da humanidade havia sido esmagada pelo Estado, escravizada pela ideologia marxista, tolhida nos seus mais comezinhos ideais de liberdade, limitada em sua capacidade de pensar e se manifestar'.
(...)
A herança de Marx não diz respeito à teoria econômica comunista ou a seu socialismo científico. Ambos produziram enormes desastres econômicos e sociais. Refiro-me ao legado antropológico, à idéia de que o homem se faz pelo trabalho. O velho Karl constatou, antes mesmo do surgimento do mercado, que a liberdade e a igualdade são incompatíveis. Que o homem livre naturalmente produz a desigualdade.
"




O que é a ditadura da urna? Alguém que sobreviveu ao "espírito de vingança de 1988", por ele assim definido o constituinte de 1988, tornou-se um dos mais chegados a Lula nos dias de hoje, mesmo derrotado. E se "O mundo anda tão complicado" era o que Renato dizia em 1991, imagine o que ele diria hoje?

quarta-feira, janeiro 24, 2007

Farewell, Fulniôs

Ferozes feiticeiros forasteiros, feitores do fogo,
A fim de ferir fatalmente os já feridos filhos da floresta,
Por ela fincavam finas facas de ferro e ferrugem.
A ferro e fogo foram fraquejando.

Foi-se o frívolo e fútil falar, o fingido favor,
O futuro fora furtado por falsos feitios.

Felizes e fartos, fortes e formosos,
Filhos e filhas, feitos em fumaça.

sábado, janeiro 20, 2007

Computadores empregam gente e cortam roupa como ninguém

Ok, ok... sei que tô queimando meu filme, mas tá aqui, entalado na garganta.

Eu entrei aqui na loja como boy. Rá! Nada de Office boy... era "boy" mesmo: "Ô boy, faz isso!", "Ô boy, faz aquilo!", "Ô boy, vai ali (no cafundé do Judas) e traz um (mundo de) troço pra cá que tá faltando!". Pois é... aquela "moleza" de vida que é ser pau-mandado de todo mundo, mas eu aprendi que todo mundo quer duas coisas: ser ouvido e ouvir o que lhe agrade. E foi por aí que passei a entregador, motorista, vendedor e gerente. Bem... não foi exatamente só com lisonja. Precisei pensar também como sexista, racista, socialista, crente, ateu... sabe como é... "o cliente tem sempre razão", mesmo quando ele é o meu supervisor ou quanto tenho que convencê-lo que na verdade o que ele está querendo/pensando é outra coisa, diferente do que ele está me dizendo (e que não há a menor condição de suprir esse pedido dele).

Também sei pegar os melhores clientes. Por exemplo: se você vê uma senhora bem humilde olhando uma máquina de costura. É fatal: ela quer a máquina, veio do interior e já está com o dinheiro na mão – vai pagar tudo à vista ou já se programou toda pra quitar tudo ligeiro. Agora, se for uma grã-fina com um celular microscópico na mão do tipo "faz tudo", é dor de cabeça na certa: o produto dá defeito na primeira semana de uso, quer um instrutor particular, misteriosamente aparecem riscos e o produto deve ser substituído por um novo, um inferno por pelo menos 90 dias. Cada setor tem suas regras: o de informática com garotos insandecidos e pais que não entendem patavina do que falam; o de móveis cheios de gente recém casada/juntada/amigada; o de eletro-eletrônicos com seus curiosos que nunca compram nada e precisam saber o que cada tecla do controle faz e etc.; aqui e acolá tem alguns diferenciais, mas no geral, pobre paga melhor do que rico, só que a gente tem que arriscar também, né? Porque quem tem mais grana pode, vez em quando, garantir uma comissão mais gorda.

Sim, mas do que eu tava falando mesmo? Ah! Sim! Que raiva! Ó, é que eu cheguei num ponto que só consigo promoção se me casar com a filha de alguém, porque daqui pra cima só tem parente do dono e não dá pra disputar a minha palavra contra a de um primo/afilhado/irmão do Poderoso Chefão. Principalmente quando seu retardado genro, do nada, mostrou ontem à noite um projeto de expansão do setor de vendas idêntico ao que eu iria apresentar esse sábado, com o mesmo público-alvo e até meus próprios dados estatísticos.

E o canalha ainda me chamou no canto, agorinha mesmo, perguntando o que ele poderia considerar como "micros de fundo de quintal" que ele tinha lido num "artigo" de uma empresa de negócios e tal. Tô correndo o risco de perder o emprego – que se dane! – tive que mentir. Disse que eram computadores. É um imbecil...

quinta-feira, janeiro 18, 2007

History just like His (love) story

Alguns poderiam chamar de "Máquina do Tempo". Eu chamo de "Livro de História 3D".

A idéia inicial era realmente ter feito uma máquina que me fizesse experimentar a vida através das eras, mas depois de ter trabalhado tanto tempo nesse dispositivo, tudo o que consegui foi alterar minha estrutura, capacitando-me atravessar para onde desejar.

Infelizmente, onde quer que eu salte, mantenho meu estado, mesmo quando me desligo do aparelho. Já até experimentei desligar o dito cujo e tudo o que consegui foi ser arremessado para o ponto de onde parti. Não dá para interagir com nada, mas é até legalzinho ver o passado, o futuro ou mesmo o presente em algum outro lugar. A única coisa ruim é que, para voltar a interagir com o mundo, tenho que voltar ao ponto de onde parti. Acredito que estou preso na minha "linha oficial" do tempo.

Percebi que assim como não posso mudar o passado, também não posso mudar o futuro. Toda ação é inédita. Não existe um recomeço. A nova chance é tão nova e diferente quanto a anterior – algo que eu já tinha percebido quando recomecei a namorar Anna "do zero" – só conheço o caminho percorrido e os botões que já apertei, assim como as cicatrizes que ganhei.

terça-feira, janeiro 16, 2007

Quem Controlará os Controladores?

Requintes de crueldade é um jargão bastante comum para designar a execução em que o autor pratica um crime impondo sofrimento ou sujeitando a vítima à humilhação desnecessária.

Como exemplo, imaginemos que alguém invada a moradia de uma pessoa de conduta duvidosa com o propósito de praticar justiça com as próprias mãos. Convencido de que já está condenado, pede que seja executado por meio de fuzilamento – uma morte digna para um soldado que cai nas mãos do inimigo –, mas lhe é negado. Então o carrasco prossegue com seu teatro de "justiça" e o executa de forma que na morte seja ofendido e humilhado, morrendo como um traidor, através da forca.

segunda-feira, janeiro 15, 2007

O Problema e a Solução do Brasil e do Mundo

Na próxima eleição já sei em quem votar: no editor-chefe da Veja. Ele soluções para tudo: violência, crime e problemas ambientais. Será que ele é parente de Jack Bauer?

quarta-feira, janeiro 10, 2007

Baby, I'm just moving on

A Internet tem sido um campo fértil para empresas ganharem dinheiro de outras empresas oferecendo serviços gratuitos para nós, consumidores*, no intuito de, basicamente, transformar-nos em "outdoors" ou expor-nos à propaganda.

No Brasil, mesmo oferecendo serviço gratuito, essas empresas são civilmente responsáveis, ainda quando aceitamos termos e contratos com cláusulas que afirmem o contrário. E ao que não tem dinheiro sobrando para cassar essas cláusulas leoninas ao redor do planeta o que resta?

A Revolução Industrial ocorreu no século XVII e os primeiros movimentos envolvendo consumidores se deram apenas no fim do século XIX. A Revolução Virtual iniciada na última década percorrerá o mesmo caminho?

Os primeiros movimentos foram bastante tímidos. Eram movimentos de opinião. Num paralelo com o presente, limitava-se em dizer coisas do tipo: "gosto da empresa Protopage, que oferece um excelente serviço que me serve muito bem" ou "não gosto da empresa CJB, que oferece um serviço limitado e custa tolerar banners inconvenientes e desproporcionais".

Era um período de auto-regulamentação, quando as empresas começaram a perceber que, além do produto competitivo, precisavam preocupar-se com a opinião do consumidor, enquanto este dizia coisas que, aos dias de hoje, seriam algo como: "quem usa o link http://skopein.cjb.net troque por http://www.protopage.com/skopein antes que seja desativado".

Às vezes, ao tentar ver o mundo de outra forma, só conseguimos enxergar o passado.


*Nem acredito que estou defendendo consumidores.

domingo, janeiro 07, 2007

Exceção de Incompetência Territorial

Sem o mínimo constrangimento a consumidora gritava "eu conheço os meus direitos". A situação em que ela se encontrava era bastante confortável: já tinha feito excelentes acordos no Juizado do Consumidor e era notório que aquela lojinha não tinha um escritório de advogados que a fizesse mofar por meses entre recursos e embargos. Conhecia o caminho das pedras. Seriam duas audiências, no máximo. Isso se a gerente não fizesse uma boa proposta ali mesmo, o que parecia bem provável acontecer.

Contudo, como fazer valer o direito brasileiro num mundo globalizado? Sorry, mi chiquitito. Pior, como fazer valer o direito local, estando, nós mesmos, afastados centenas de quilômetros do país onde ocorreu a lesão senão contratando um defensor daquele lugar? A verdade é que, para a grande maioria da população mundial, "O Direito" é algo que beira o intangível.

Um bom exemplo disso foram os casos de indenizações do acidente do Fokker da Tam: quem tinha condições econômicas para processar as fabricantes do reverso da turbina, as empresas americanas Northrop e Teleflex – 65 das 99 famílias das vítimas –, foram para a Justiça americana e conseguiram indenizações entre US$ 500 mil (R$ 1 milhão) e US$ 1,5 milhão (R$ 3,2 milhões); os demais – as outras 34 famílias – fizeram acordo com a TAM receberam cerca de US$ 145 mil (R$ 310 mil) cada uma. (Fonte: Isto É)

Fugindo da discussão se a Justiça é ou não universal, o Direito é, eminentemente, local. Mesmo as convenções internacionais, para tornarem-se eficazes em cada país ratificador, devem ser transformadas em lei local. Respeitar essa soberania jurídica num mundo virtual sem fronteiras tem sido um grande exercício de abstração. Afinal de contas, aonde ocorreu a lesão? Em que lugar do planeta o servidor está instalado? Existe a mesma proteção legal naquele local para que se possa dizer que houve "infração"?

O direito brasileiro tem uma solução pouco eficiente para "hoje": o local da última ação ou omissão no Brasil. Isso, na grande maioria das vezes, não nos atende mesmo quando se trata de um infrator nacional. E quando o infrator é um chinês com um IP registrado por uma empresa alemã e com um servidor rodando em Papua-Nova Guiné?

O Tribunal Penal Internacional tem uma esfera de ação muito reduzida e não existe um Tribunal Civil Internacional. O que existe é uma grande lacuna nessa terra virtual, onde o caos só não impera porque a grande maioria dos usuários tem bom senso.