quarta-feira, maio 09, 2007

PEC 54

Tenho acompanhado a PEC-54/1999¹ e ontem recebi um email com sua movimentação. A proposta é incluir o seguinte artigo no Ato das Disposições Transitórias:

"Art. 76. O pessoal em exercício, que não tenha sido admitido na forma prevista do art. 37 da Constituição, estável ou não, por efeito do art. 19 do ADCT, passa a integrar quadro temporário em extinção à medida que vagarem os cargos ou empregos respectivos, proibida nova inclusão ou admissão, a qualquer título, assim como o acesso a quadro diverso, ou a outros cargos, funções ou empregos."
Isso legaliza, até a aposentadoria, todos os que estão em situação irregular às custas do erário.

Qual não foi a surpresa, não apenas um, mas dois deputados apresentaram requerimento para "inclusão na Ordem do Dia da Proposta de Emenda à Constituição nº 54": o Deputado Rômulo Gouveia (PSDB-PB) e o Deputado Clodovil Hernandes (PTC-SP).

Conheço a ambos apenas por suas notórias carreias, não possuo nenhum elo pessoal, mas como o primeiro é da terra onde estão fincadas minhas mais profundas raízes, senti-me obrigado a enviar-lhe um email.

**Update: Ontem, 09/05/2007, o Deputado Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB) e o Deputado Davi Alcolumbre (DEM-AP) fizeram tambem requerimento. O primeiro é muitíssimo conhecido aqui no estado, tem uma carreia política desde de quando eu me entendo por gente. Modifiquei um pouco o email e enviei-lhe meu protesto.
Excelentíssimo Senhor Deputado Ronaldo Cunha Lima,

É com muita tristeza que tenho observado esse esforço em aprovar uma proposta de emenda à Constituição que tem como fundamento a perpetuação de uma realidade de ineficiência ao serviço público em detrimento do direito à isonomia. Sobretudo quanto existe um método legal, previsto na Constituição da República que dá igualdade de oportunidade para todos e que promove o preenchimento do quadro de funcionários públicos através da seleção de pessoas tecnicamente melhor preparadas para o múnus público.

O concurso público consagrado no artigo 37 da Carta Magna como requisito do servidor é, ao lado da licitação, a expressão mais forte dos princípios da administrativos da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Esta proposta de emenda à constituição afronta a praticamente todos esses. Ao da legalidade criando uma regra de exceção para manter uma situação de irregularidade; ao da impessoalidade, favorecendo poucos em detrimento de muitos; ao da moralidade, preservando o que na própria fundamentação da PEC chama de "fardo" de governos passados que "nunca são alcançados nem responsabilizados", conforme o texto; ao da eficiência, deixando de selecionar um cidadão mais preparado para desempenhar a função conforme critérios objetivos. E ainda mais, mostra o descaso com a coisa pública preservando essa situação até que todos os cargos e empregos voluntariamente seja vagos.

Com toda a vênia, o propositor da PEC, ao defender que "numerosos contingentes de servidores em geral, das mais diversas categorias e níveis profissionais, ocupantes de cargos ou empregos, ou, mais comumente, contratados temporariamente, mas cujo vínculo, juridicamente, se tornou por tempo indeterminado (...)" possa ser justificativa para esta norma, somente reflete má vontade do administrador ao deixar de promover um concurso, que não trás absolutamente nenhuma despesa, visto o excepcional número de concurseiros lutam por uma ou duas vagas a cada oportunidade que se abre pelo país, tornando a publicação do certame praticamente uma expectativa de renda ao ente público promotor do concurso.

E o que ainda mais me entristece é ver um deputado da minha terra, conhecedor do mundo jurídico, que sabe perfeitamente que no direito administrativo não existe elo jurídico fora da legalidade entre particular e administração, que conhece a realidade de um estado que vive arrastado com funcionalismo público arcaico e ineficiente e, que, consciente de todos esse fatos, atua de forma promover um verdadeiro bloqueio à modernidade desta nossa terra.

Oxalá Vossa Excelência reconsidere as razões dessa PEC materialmente inconstitucional e mostre-se fiel ao ao propósito de construir uma sociedade livre, justa e solidária.

Cordialmente,
Esse não é meu primeiro email enviado a um político e nem será o último, independente da resposta que eu tenha (ou do provável silêncio), ao menos tenho a conciência de cumprir o mínimo do meu papel de cidadão.


¹ A fundamentação e o dispositivo da PEC estão nessas páginas: 1, 2, 3 e 4.

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