segunda-feira, janeiro 31, 2005

Tema Único: Ying e Yang

Ah! Se pudesse ver tudo tão certo como branco e preto.
E se pudesse distinguir as pessoas boas das más.
E se enxergasse aquele ponto determinado de maldade na pessoa boa.
E o de bondade naquela que é má.
E se bom e mau não perseguissem um ao outro.
E se bom e mau não precisassem fugir um do outro.
Mas o mundo já deu tantas voltas.
Que não vê ying e yang.
Que não vê o certo tão certo.
Que não vê o errado todo errado.
Não há nada definido.
Não há contornos.
Só há nebulosidade.
Um imenso círculo cinza.
É esse o risco da indefinição, é o risco de tudo virar cinza, e de virar pó.

Saudações aos eternamente determinados!
E aos seres míticos que renascem das cinzas!
A todos os demais que vivem num mundo acizentado, meus pêsames.
Porque o meu mundo foi pintado com sangue azul e vermelho.
Eu verti o vermelho.

quarta-feira, janeiro 26, 2005

Manifestação

EU PROTESTO:

    – Contra os ignorados na votação do Tema Único
    – Contra o preconceito que sofrem aqueles que são verticalmente prejudicados
    – Contra os pensamentos obsessivos e desagradáveis que nos invadem sem pedir licença
    – Contra os sentimentos que recusamos ter e acabamos sentindo do mesmo jeito
    – Contra os que deixam cadeiras e vasos no meio de ambientes escuros
    – Contra os que fazem as coisas por implicância só por que apostamos que não iriam fazer
    – Contra a falta de investimento no desenvolvimento do setor terciário do nosso estado
    – Contra os vendedores e atendentes que só nos atendem se estivermos bem vestidos
    – Contra os garçons que ficam xavecando e demorando para nos atender
    – Contra as embalagens de Doritos (sabor nacho) que, por um motivo desconhecido, sempre se rasgam de alto a baixo
    – Contra Murphy por ter inventado uma lei tão absoluta
    – Contra baratas, ratos, escorpiões, formigas e outros inquilinos que moram na minha casa contra a minha vontade, criam gastos e nem sequer ajudam no aluguel
    – Contra mofos, bolores e fungos que aparecem em todo canto, só porque eu estou tentando emagrecer
    – Contra concursos que nos forçam estudar absurdos que nunca iremos enfrentar na vida real
    – Sobretudo contra todos as lanchonetes que se preocupam em ter maionese e catchup à mesa e nunca se lembram de que tem gente que prefere mil vezes mostarda!

quinta-feira, janeiro 20, 2005

Vestígios

"Mais um dia para conquistar o mundo", foi assim que ela saiu, deixando a porta do quarto aberta – só Deus sabe por quê, ainda mais quando se mora numa república. Talvez para não chamar tanta atenção, afinal de contas, os segredos não são feitos para serem descobertos?

No quarto: uma mesa, uma cama, um espelho e um armário. Na mesa, o trivial de todo marqueteiro: folhetos de concorrentes, planilhas, revistas e livros. Na cama, travesseiros, lençol, calcinhas, várias blusas e calças. No espelho, recadinhos. No armário... fechado. O que ninguém sabia é que existiam monstros no armário, cobras peçonhentas e lagartos nas gavetas. O armário era a única coisa fechada, mas também deixava a chave na porta. Sempre deixava tudo assim.

Mais comum que a saída foi a chegada, na ida a mil por hora, na volta a vinte. Mas não pôde deixar de perceber, alguém entrara ali, qualquer um perceberia.

Abriram o armário. A porta aberta. A gaveta entreaberta. Uma cobra morta pendurada. Um chaveiro sumido. Um cinto e uma carta no chão. Retalhos de jeans e pelica, e gotas de sangue que não eram suas.

Os desprevenidos sempre saem feridos. Os curiosos também.
São uns teimosos, e com a teimosia reside a burrice.

sábado, janeiro 15, 2005

Era o planeta dos meus sonhos

Antes de voltar ao meu planeta natal, decidi parar num vizinho que ainda não tinha visitado. Todo mundo era muito parecido comigo e muito parecido com o que eu tinha visto na Terra, a única coisa realmente estranha eram os capacetes que usavam. Não tinha criança ou velho, jovem ou adulto, homem ou mulher, que não tivesse um.

Nem sabia que língua falavam, mas a curiosidade foi tão grande que acabei abordando um dos transeuntes e entre palavras e gestos perguntei:

– Amigo, diga-me uma coisa, esse capacete é uma moda ou indumentária?

Ele levantou a viseira até a altura da testa e imediatamente fiquei sabendo de que aquilo controlava a comunicação entre eles, fiquei sabendo que com a viseira aberta até aquela altura as conversas poderiam fluir e era mais ou menos assim que viviam. Foi de uma espontaneidade tão grande que nem me contive e fui além:

– Ok, mas porque usar um capacete inteiro? Não podiam usar um negocinho mais discreto?

Ele ficou sério – iria fazer uma breve demonstração, já que provavelmente nunca iria me ver de novo – então, tirou o capacete só por um segundo (daqueles segundos que duram um século). Era uma avalanche! Milhares de pensamentos, centenas de histórias e de momentos da vida dele: vezes que, acidentalmente, ele tinha derrubado o capacete em frente de sua paquera; ou quando tinha quebrado a viseira no meio do trabalho e não pôde falar com ninguém... Eram tantas lembranças que fiquei tonto (também fiquei sabendo que ele me achava muito curioso, inoportuno e feio). Foi quando percebi que se comunicavam apenas por pensamento, e não com voz ou boca. Tão logo aquele segundo acabou, ele se virou e partiu apressadamente pelo seu caminho.


Nem eu nem ele estamos preparados para a transparência e a sinceridade, ou talvez, não sejam tão boas assim... e eu que pensava que eram a solução para tudo...

quarta-feira, janeiro 12, 2005

Uma inteira e uma meia, por favor

Não existe música alta e pesada o suficiente que nos impeça de ouvir nossos pensamentos, nem ferida na pele que supere a dor do coração.

Sem querer, tinha que se convencer de que ele tinha ido embora e ela também não poderia ficar. Na casa, pendurou a tábua: "VENDE-SE OU ALUGA-SE", juntou o que tinha e viajou para onde o dinheiro a levasse.

Sabia que tinha que só sairia daquela situação quando encontrasse um inquilino com proposta de compra (tem espaços que não podem ficar vazios), e com o peito vazio, mal conseguia respirar.

Pensava que amava mais a filha do que ele, nunca esteve tão errada, descobriu que os cômodos dos dois eram separados.

terça-feira, janeiro 11, 2005

Sour Guy

Ouvia meu silêncio, lia as palavras que eu não escrevia... De alguma forma, usava-me para se curar, retirando de mim o antídoto precisava. Brigava sozinha, berrava, esperneava, praguejava na minha frente e, como num circo, eu ria do seu show particular. Quantas vezes não sonhei colocando-a no meu colo para acalmá-la, se pudesse tocá-la, se estivesse por perto, mas eu apenas sorria.

Desapareci (ou foi ela?) e reapareci (ou busquei-a?) quando eu precisava me curar.

Então, ela ouviu meu silêncio, leu as palavras que eu não escrevi... De alguma forma, cuidou de mim, retirando de mim o veneno que me matava. Foi quando percebi que era isso que ela fazia desde o primeiro dia que a conheci.


Para quem nunca quis me conhecer (dizia que se sentiria nua, se me visse), não esperava um pedido de casamento. Daqui a cinco anos, talvez, quem sabe?

sexta-feira, janeiro 07, 2005

Amo-te... ainda

Sempre achei que essa minha personalidade era muito caracterizada pela lealdade, entrega e firmeza das posições, hoje tive certeza. Pois tento ser sensato, moderado, racional, equilibrado, mas não sou, sou radical, apaixonado, 100% em tudo (apesar de ser inconstante quando as coisas perdem a graça), mas nos relacionamentos é tudo ou nada, mesmo tentando manter a pose. Apesar de ter terminado um relacionamento de 4 anos, 5 meses, 17 dias e 9 horas, no dia 23/12 (acabamos porque tinha que ser, ainda que gostando um do outro – ela queria que eu apostasse tudo, mas não queria perdê-la na aposta, ela era cara demais pra mim). Fiquei na minha, completamente dedicado aos meus projetos, quando tive a notícia, hoje, de que tem um carinha investindo e acompanhando Carla. Pronto, foi o suficiente para vir todo o sentimento de perda e eu me sentir o pior dos homens da face da terra.

Cada mitocrôndria era Carla... a cada ciclo de Krebs era Carla... clivagem de succinil CoA... (Carla!?) – Toronto está linda nevando, meu doutorado está uma droga, se ela estivesse aqui, eu a ensinaria a patinar... Férias, Brasil, Julho, Carla... Bomba!

Toda vez eu penso que já estou acostumado a me sentir nas nuvens quando estou com alguém e me sentir um lixo quando terminamos (e olhe que eu enrolo muito pra terminar, porque sei o quanto é difícil para mim depois). Não sou de chorar, mas parece que a gente nunca está acostumado com sofrimento, o negócio agora é torcer pra que esse estômago embrulhado e o coração despedaçado cicatrizem logo.

Só nós para nos entendermos... sou visto como soberbo, dono do mundo, quando na verdade meu coração é todo de manteiga derretida. Mas "estamos aí, firme e forte", mantendo a pose como se nada estivesse acontecendo. Se é do signo de leão ou do ascendente escorpião ou da minha própria personalidade, eu não sei... mas que eu estou pagando pra sair dessa montanha-russa, isso eu estou! Cassimiro aqui, vai enfartar, já, já, desse jeito.

quarta-feira, janeiro 05, 2005

São 100%

Tomei clorofórmio pra manter a juventude. Lavei a cabeça com cloro pra manter minha mente limpa. Comi isopor pra me sentir mais leve. Respirei hélio pra falar com fineza com os que me cercam. Quando morri, fui reciclado pra evitar a poluição.

Tentei ser pé no chão, tentei ser sóbrio, mas não sou. Sou extremista demais. Loucura e Desequilíbrio, meus mais íntimos companheiros, fingidos amigos.