sexta-feira, setembro 29, 2006

Terra nas Infinitas Crises

Com o planeta prestes a explodir, o último filho de Krypton é lançado pelo espaço indo até a Terra, caindo na cidade perdida de Atlântida, onde acaba sendo criado como o Senhor dos Mares. Certa noite, quando saía com seus pais de um espetáculo, foi abordado por um ladrão que, durante o assalto, acabou matando os dois, mas antes de revoltar-se da vida e transformar-se no Cavaleiro das Trevas, uma nave cai, matando o meliante. Dentro dela, sai um extraterrestre moribundo oferecendo uma lanterna verde para lutar em favor da justiça. A partir daí, lutava contra o crime durante o dia e, à noite, ganhava a vida na criminalidade, numa das esquinas do Pentágono, sob a alcunha de Diana, a Maravilha.

terça-feira, setembro 26, 2006

Os olhos cor de pimenta

Quanto ao tempo, todo moleque é como Deus, não lhe dá a mínima atenção. O perigo causa frio na barriga. E se não houvesse perigo, que graça teria? Saltaram pelo rio até chegarem ao tédio, quando preferiram entrar no meio do mato. A fome os levou a um cajueiro rançoso, depois a um pé de laranja cravo e a outro de oliveira. Deixando o cavalo pastar, atravessou um velho milharal, seco e sem espigas. Do outro lado, tinha uma clareira e uma casa em ruínas. Era de alvenaria. Portas e janelas tinham sido roubadas, assim como telhas, caibos e ripas. A casa era só parede. Contudo os donos estavam lá – cães dos infernos! Sentiu a picada dum marimbondo e partiu em disparada. Mesmo voando na velocidade da luz, ouvia os condenados até que caiu num pequeno açude. Debaixo d'água havia um zumbido aquático. Emergiu, enfiou a mão na orelha latejante, que já estava cinco vezes maior que a outra, e arrancou o pestilento. Ainda escutava o zumbido de longe. O cão dos infernos deixara sua alma lá dentro para perturbá-lo. Para não virar piada, esperou o orelha diminuir e a pulsação passar com um cochilo à sombra duma árvore e o Fantasma amarrado nela. Já ensaiava a cara-de-pau de que nada tinha acontecido e, pela altura do sol, iria fujir e desviar-se de chinelos voadores. Era a vida... O sono chegou leve, mas chegou e ficou por ali um pedaço.

Dor.

sábado, setembro 23, 2006

Os olhos cor de riacho

O cavalo e o moleque eram um só. Não podiam ver alguém com chicote que davam coices para todos os lados. Já com cabresto Fantasma era mais conivente do que o outro, que, por sua vez, aceitava mais essa coisa de roupa. Não gostavam muito de andar. Da estrebaria ao Bambusal cansariam se fossem trotando, mas do Bambusal até o rio, nem o Capeta conseguiria alcançá-los! Irmãos, filhos de truta, poderiam passar a manhã pulando nas pedras, subindo a correnteza e assustando os peixes menores. Apesar das barbatanas, faltavam-lhes guelras, e quem precisaria delas se costumavam voar rente ao chão? Talvez hoje, já que estavam nas águas dum ribeiro cuja cabeceira tinha sangrado. Faltaram ao almoço e houve quem dissesse que voaram para além das nuvens. Rompendo o silêncio, somente os cururus e as cigarras anuncivam o fim do dia.

Ainda não era noite.

quinta-feira, setembro 21, 2006

Os olhos cor de lodo

Como todo bom moleque, também era malcriado. Sempre que avisavam que passariam o fim de semana na fazenda, ele reclamava que lá não pegava TV e perderia o desenho. Quando chegava lá, quem procuraria televisão? Saia correndo atrás do Fantasma, um cavalo que, como ele, fora criado nas artes da assombração: desaparecia quando queria e aparecia noutro extremo, andava sem fazer barulho, principalmente se fosse para roubar comida, diziam que voava, sempre rente ao chão. O moleque era do mesmo jeito. Se fosse pão de queijo ou pão de ló, nem as paredes úmidas da cozinha o veriam, mas, certamente, o lanche desapareceria, para o desespero de Zefinha.

Traquinagem.

terça-feira, setembro 19, 2006

Os olhos cor da noite

De longe escutou o avô abrindo o cadeado do quarto no fundo do quintal. Desceu do alto da goiabeira mais rápido do que qualquer humano que caísse em queda livre. Um minuto depois já estava no cós do avô com duas goiabas – da branca que eram mais molinhas, mas sempre tinham bicho – só uma para dar, claro. Ali dentro, pés, mãos e dedos do moleque ficavam paralisados e a voz emudecia. Só os olhos corriam. De um lado a outro, seus 437 olhos admiravam cada vagão e de cada trem e, naquela cidade miniatura, viajavam nas histórias do velho. Com as mãos e o queixo apoiados na quina da mesa, os olhos corriam no campo, nas ruas, na montanha, descendo o rio e atravessando a ponte sobre o lago ao som das máquinas, do apito do trem e das palavras entusiasmadas do avô, até o clímax, quando as luzes do quarto eram apagadas. A cidade resplandecia e os faróis corriam sobre os trilhos negros.

Não era sonho.

sábado, setembro 16, 2006

Os olhos cor de terra

O moleque era cheio de pés, mãos, dedos e olhos - por todos os lados. Nada fugia ao seu alcance tinha que ser manuseado, desmontado e, com sorte, remontado. Do jambeiro ao armário da cozinha, da casa do cachorro ao galinheiro, o macaquinho podia estar em qualquer lugar. O avô, mesmo que pudesse, não gritava mandando-o descer, sentar, parar, limpar-se, soltar o rabo do bicho. Acompanhava com os olhos d'água aquele pinga-fogo que tinha herdado dele a vontade de desbravar.

Saudade.

terça-feira, setembro 12, 2006

V de Vingança

"Intimidade devassada pode ser ruim. Porém, bem pior é ser estraçalhado num atentado terrorista. Prefiro ficar nu a virar picadinho."

"Uma das razões que me levaram a moderar os comentários antes de efetivamente publicá-los no blog é o processo sofrido pelo blog Mídia Marrom."

"Se vocês não querem amanhã ou depois passar pelas agruras que estou passando, simplesmente tratem de hospedar seus blogs num país que tenha ordenamento jurídico diferente. Ficando no Brasil, eliminem os comentários."

Estaríamos vivendo um novo contrato social? Pelo pretexto do medo, estaríamos dispostos a abdicar de nossos direitos para podermos sobreviver? Estaríamos dispostos a abandonar nossa vida para termos uma sobrevivência mais segura? Com todas as minhas forças espero que não.

Mais do que um prenúncio do amanhã, V de Vingança adverte que o medo não pode regrar uma sociedade. Não se pode dar tamanho poder ao Governo ou à Justiça a fim de "desfrutarmos" duma vida quieta e sossegada. Em Direito Administrativo, uma questão que deve regrar os atos da administração é se o fim almejado compensa a a interferência estatal e se não existem soluções menos intromissoras – é o princípio da não-intervenção. Contudo, o medo tem tirado nossa privacidade, nossos remédios durante os vôos, nossa intimidade, nossa hospitalidade, nosso desejo de deixar que outros interajam em nossos blogs. Medo de perder a vida ou medo de ser alvo da indústria do dano moral (e, neste último caso, respondendo por terceiros).

Absurdos como "a instrução foi encerrada sem que se ouvisse as partes" podem acontecer em qualquer lugar do planeta, mas caberá ao seu representante legal, ao fiscal da lei e ao egrégio tribunal reverter a injustiça em justiça. O que não pode acontecer é que seu medo vença a sua vontade de lutar pelo que se acredita. E se acha que fugir é solução, mais uma citação:

"Dando continuidade à sua teatral “Caça às Bruxas” no site de relacionamento social Orkut, a 17ª Vara Federal Cível de São Paulo autorizou uma multa de R$ 50 mil por dia caso o Google Brasil não acate a ordem judicial de enviar os dados de comunidades e perfis de usuários do referido site."

No Direito Penal, para os crimes que acontecem fora do país, a lei brasileira diz que o local do crime será onde ocorreu a última ação dentro do território nacional. No Direito Civil, será sede de uma empresa multi-nacional o escritório ou qualquer agência que a represente dentro do território nacional, respondendo por todos os atos da empresa ou do grupo a que pertence.

– Viajar nu acabará com os ataques terroristas?
– Moderar comentários impedirá o dano moral por algo que para você não significava nada?
– Hospedar seu blog fora do Brasil livrará de sentenças judiciais equivocadas?
Se é para jogar pelo ralo o Princípio da Não-Intervenção, que se jogue também o da Eficiência!

segunda-feira, setembro 11, 2006

Num calor de 30º

É impressionante como chama a atenção um terno bem cortado, um sapato bem cuidado e um cabelo bem arrumado.


(Bem que elas já diziam que toda elegância vem com algum sofrimento)

sexta-feira, setembro 08, 2006

Seria algo como "querido diário"

...resumindo meu feriado, fiz viagem astral. Projetei minha mente em busca de outras formas de vida inteligente. Primeiro, fui pelo que eles chamam de Andrômeda e, depois, Via Láctea. Não encontrei nada muito relevante. Mas sem querer ser tão duro, encontrei um planeta que eles chamam ironicamente de Terra. Não chego a dizer que lá tem vida inteligente. Eu diria que, no máximo, vez por outra, eles têm umas boas sacadas...

domingo, setembro 03, 2006

Na casa de praia de Edgar e Beth

– Eu ainda me lembro quando Edgar me pediu a mão, estávamos curtindo as férias nos Lençóis (maranhenses)... e como foi com Léo?
– Não, não, nada disso. Você sabe como ele é. Chegou com aquele jeito dele e falou: "Didinha, eu estava pensando... quando assumirmos nossos cargos, você sabe, não vai dar pra se ver todo dia, vai ter que ser naquele esquema de quinze em quinze dias, ou então a gente casa e fica até mais barato pra gente rachar as despesas com uma casa só. Topa?"
– "Topa"? De onde você tirou esse homem, mulher?
– Piancó! Não fale nada não que eu sou de Cajazeiras. Ah! Mas é que era timidez dele, você sabe como ele é. Tímido...
– Vocês tiveram sorte de ter passado no Fisco e no Procuradoria na mesma época. Tava esperando só isso pra casar, heim?
– Nada! A gente já tava namorando há dois anos, eu tinha que escolher se ia continuar ou cada um pro seu lado. Além do mais, eu tava com medo de ser mandado lá pras brenha enquanto ela ia continuar aqui na capital.
– Ele sempre me respeitou muito, até mais do que eu queria.
– E quando foi a primeira vez?
– Ah não! Só depois que nos casamos.
– Nossa!
– É.
– Homem! Quando Lídia foi para cozinha ajudar a mãe com o almoço, o velho sentou ao meu lado no sofá e disse: "se tu tocar nela, eu te capo".
– Caracas! E o que você disse?
– Eu? Primeiro que eu tremi feito vara verde, segundo que tudo que eu podia dizer era "sim, senhor"!