sexta-feira, março 10, 2006

Eco

Acordou, mas não abriu os olhos. Foi esticando o braço em direção ao outro lado da cama, tateando, até alcançar o travesseiro vazio. Ele já tinha saído às três e meia para Santana - iria passar a semana inteira lá - e não podia viajar na segunda. Tinha que ser no domingo. Tinha que deixá-la sozinha naquele domingo? Não que não fosse um domingo qualquer, mas podia passar ao menos a manhã juntos, não? Os três podiam ir ao parque. Por que tinha que viajar tão cedo? Era melhor nem ficar pensando tanto nisso para não azedar ainda mais aquele dia.

Depois de todo esforço que fez: largar engenharia - o curso onde eles se conheceram - e ter que transferir para arquitetura, porque nesse fim de mundo não tem outro curso que a empolgue; deixar a mãe, a família e todos os amigos; trazer a filha para essa selva de pedra e poeira; e abandonar o mar - saudade do mar, nunca pensou que o mar faria tanta falta. Depois de tudo isso precisava fazer mais um esforço, levantar da cama para ver a menina que já tinha acordado no quarto ao lado.

Não entendia como aquele corpo parecia tão pesado. Tinha perdido peso junto com a vontade de comer, tinha posto os sonhos de lado, tinha posto as companhias de lado, tinha posto tanta coisa de lado que nem sabia o que tinha retido para si. A vaidade também estava posta de lado. Talvez tinha posto tudo do lado dele, porque ele continua tão seguro de si, tão cheio de vida e de espírito, e ela... nada. Tinha posto o brilho de lado também.

Quem se importaria se ela estava nua ou vestida? Bonita ou feia? Fazia tanto tempo que não ouvia um elogio, mas andar pela casa de calcinha incomodaria. Com muito esforço, levantou-se, pegou o roupão e foi amamentar.

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