Atrasado, mas nem tanto assim
Na última vez que me desmaterializei, minha intenção era assistir a morte duma estrela numa galáxia um pouco depois da Via Láctea – só até a Via Láctea eu já acho distante, mas valia o esforço. Contudo, tive alguns problemas ao passar perto dum buraco negro e acabei chegando atrasado. Aliás, aconselho a vocês, passem longe desses troços! Passei dias para conseguir me materializar novamente.
O melhor de tudo foi a volta para casa, sem perceber, passei tempo demais preso. Com isso, tive dois problemas, daqueles que você acha que nunca vai ter na vida, para resolver: um judicial e outro familiar. Primeiro, tinha que provar que eu era eu e não estava morto. Fui declarado ausente, que é a presunção de morte, e morto não tem nenhum direito. Logo, tinha que demonstrar que ainda era sujeito de diretos plenamente capaz. A segunda tarefa era convencer meu neto (meu tatara-tatara-sobrinho-neto, na verdade – ou seja lá o que isso for – tecnicamente, um parente de 6° grau na linha colateral, que é aquilo que tenho de mais próximo ao que se pode chamar de família) a não fazer a mesma viagem que eu tentei fazer.
Perante o juiz até que não foi difícil, só levou um ano para que eles percebessem que eu estava vivo. Duro foi fazer meu neto engolir que dessa vez eu iria registrar tudo com imagem e som de alta-qualidade.
Só não contei para ele que no caminho até aonde vai ocorrer a próxima explosão tem dois buracos.
Está aí uma coisa que eu não quero para minha rotina: ficar preso em algo e não ver o tempo passar.
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